City Hunter: Shinjuku Private Eye é o puro suco oitentista

City Hunter: Shinjuku Private Eyes é o mais novo filme da franquia City Hunter, lançado no Japão em fevereiro desse ano, 2019. A franquia teve origem com o mangá escrito e desenhado por Tsukasa Houjou (Cat’s Eye, Angel Heart). O filme foi produzido pela Sunrise (Gintama, Tiger & Bunny), com direção de Kenji Kodama (Detective Conan, Reporter Blues) e roteiro de Yoichi Kato (Aikatsu, Yokai-Watch). 

Uma grande franquia sobre a qual não sei nada

City Hunter é um caso curioso. Uma franquia gigantesca, com múltiplas séries, live action, e até um filme protagonizado pelo Jackie Chan, mas muito pouco citada no ambiente brasileiro de animangos. Parece um caso semelhante ao de Cavaleiros nos Estados Unidos, se formos traçar paralelos.

Falando sobre minha experiência em si, cheguei a ler uns poucos volumes do mangá, mas acabei desanimando pela falta duma tradução completa da série. Então não chego a não saber nada. Não quer dizer que saiba de fato de alguma coisa. Como o caro leitor possivelmente está no mesmo sentimento, acho que vale uma sinopse mais robusta.

City Hunter conta a história de Ryo Saeba, um varredor (não sei uma boa tradução pra sweeper, perdão) de criminosos residente em Tóquio. Contratado de uma forma meio críptica, ele virá a sua ajuda. Um tanto tarado, mas plenamente capacitado. City Hunter segue esse amontoado de casos que o Saeba vai aceitando, junto a sua patotinha do barulho. 

No caso do filme, o Saeba é contratado pela modelo Ai Shindo, que sente estar sendo perseguida por alguém. Toda a ideia por trás do Shinjuku Private Eyes é dar um olhar moderno pra franquia, uma remodelada para o século XXI, com cyber gadgets, drones, e robozinhos garçons. Seria uma paralelo com o Lupin III: Part V, do ano passado.

Diferentemente do Lupin, no entanto, essa encarnação de City Hunter não está interessada em discutir a contemporaneidade de uma franquia de 50 anos. Muito pelo contrário, está aqui para demonstrar que um homem gostoso demais dirigindo um ônibus com uma doze de cano cerrado atirando em drones gigantes ainda é eficiente e refrescante.

O cafajeste de bom coração

O grande vai ou racha com relação a City Hunter acaba dependendo da relação entre o espectador e o protagonista, Ryo Saeba. Digo isso por ele ser o típico estereótipo do tarado de bom coração, o cafajeste cavalheiro. Pelo menos nesta encarnação de 2019 ficou bem equilibrado na maior parte do tempo. Mesmo que uma ou outra piada seja um tanto fora de lugar.

Principalmente a do drone na sessão de fotos, toda aquela gag dele tentando espionar as modelos se trocando, completamente desnecessário. Além de desnecessário, sem graça. Ao menos o filme sabe rir de si mesmo, com uma piada logo no início sobre como ele não poderia mais assediar, “não estamos mais nos anos oitenta”.

Se estamos falando em anos oitenta, fique avisado, City Hunter é um filme de brucutu no seu melhor. Explosões absurdas, planos mirabolantes, dois homens saindo no soco porque armas não tem honra. Enfim, saiba onde está entrando.

Isso posto, ele sabe se utilizar da fórmula. Não se leva tão a sério assim, afinal nem poderia. E aposta no gigantesco carisma do protagonista para carregar a trama.

Ryo Saeba é charmoso, com um magnetismo a todo momento que aparece em tela. Sempre no controle, mas só a um passo de perdê-lo. Estiloso o suficiente para disparar apenas no ombro ou na arma dos capangas, habilidoso o suficiente para desviar de mísseis. Ryo Saeba é o City Hunter.

Neon e telhados

Falando de um aspecto um pouco mais técnico. Amo como o filme monta suas cenas. As cenas de ação sempre muito enérgicas, sem deixar o espectador perdido nos saltos e cortes. Variando bastante os ambientes onde a ação tem lugar.

Não é das produções mais caras, com visuais mirabolantes e constantes momentos sakuga. Muito pelo contrário, City Hunter aposta muito mais num visual mais clássico, quase parelho com a qualidade de uma série de temporada atual. Mas a direção segura muito bem.

Isso se dá principalmente com o modo que Shinjuku é mostrada através do filme, em todos os seus rostos e facetas. Majestosa nos telhados, em sua vastidão de luzes através de uma tomada aérea. Brilhante em suas ruas, nas passagens de carro. Cheia de placas de neon e claustrofóbica nos seus becos, onde uma das melhores cenas de ação tem seu momento.

Essas inúmeras Shinjukus, dispares e únicas, se unem de forma bastante harmônica formando uma única entidade coesa. Uma cidade viva que respira por através da tela. Esse mundo vivo que permite a contagem de uma infinidade de histórias, com esse filme como uma degustação.

Degustação essa que se dá por todo o roteiro, passando pelo que (imagino ser) o elenco de personagens mais icônicos da franquia. Um gosto de fanservice de uma experiência que não vivi paira por todo o filme. Se ele funcionou para algo, foi para me fazer correr atrás da série original.

Os personagens originais do filme

Pra fechar, não posso deixar de falar dos personagens centrais desse filme. A já supracitada Aoi Shido e o vilão, Shinji Mikuni.

Quanto a Aoi, é uma personagem ok. Não tem lá um desenvolvimento muito interessante. É a personagem comum que está perdida na vida e brigada com um parente, e recebe a determinação para voltar aos eixos quando a relação com esse parente tem uma virada. Um arco batido, mas bem realizado.

Já o caso do Shinji Mikuni é mais complicado. Complicado por ele ser um personagem ruim. Tanto como personagem em si, mas principalmente como antagonista. Ele é um vendedor de tecnologia que quer começar a vender drones controlados pela mente. Não pude evitar lembrar de Sword Art Online: Alicization, o que é cômico.

Mas para além disso, o Mikuni é um amigo de infância da Kaori Nakamura, parceira e braço direito do Ryo Saeba. Eles se reencontram, pipipi popopó, agora é pessoal contra o Saeba, ciúmes, etc.

Além de clichê e um tanto ultrapassado, não temos sequer tempo de acreditar nessa suposta relação entre o Mikuni e a Kaori. E a relação ainda serve pra transformar a Kaori numa donzela em perigo no terceiro ato. Toda a piada de não estarmos nos anos oitenta não funciona tão bem agora, né senhor City Hunter?

Fora esse fato merda, ele não consegue ter presença no roteiro. Nunca parece uma real ameaça. Mesmo quando ele de fato assume o controle, simplesmente não tem como comprar aquela figura como sequer próxima de estar a altura do nosso menino Saeba.

E a conclusão com discurso motivacional da Aoi, nossa, um brega bem ruim e melodramático que não reflete o resto do filme de maneira alguma.

Um charmoso filme ok

Talvez essa seja a melhor forma que eu possa descrever City Hunter: Shinjuku Private Eyes, maravilhosamente medíocre. Tem sinais de personagens ótimos, tem uma galhofa gostosa demais, tem cenas de ação bem coreografadas, mas amarrado numa trama um tanto fraca, com vilões esquecíveis e temática confusa. Em mais de um aspecto me lembra bastante o já criticado Blackfox.

No frigir dos ovos, vale bastante como porta de entrada pra franquia, ou como um gosto de fanservice depois de um longo tempo sem uma animação de City Hunter. Vale pelo visual, pelo plástico, e por ter 1h40 de duração. Principalmente vale por ter um careca bombado atirando uma bazuca enquanto usa óculos escuros num parque durante a noite.


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