The Price of Smiles quer contar duas histórias, e não conta nenhuma

The Price of Smiles me foi uma surpresa no começo da temporada, por mais atrapalhada que era o ritmo do primeiro episódio, ainda tinha algo lá que me parecia passível de criar coisas boas. Então insisti, e o segundo episódio, meio corrido, me entregou um twist interessante. Mas os episódios passavam, e com ele empilhavam os problemas, mas eu ainda acreditava, que a história ia se pagar. Pois bem, não se paga, sejam bem vindos a review de The Price of Smiles.

Começo conturbado, mas promissor

Já que esse é um anime menos popular do que os que eu tendo a fazer review. Acho válido estabelecer o que é The Price of Smiles. The Price of Smiles é o mais novo projeto autoral da Tatsunoko Productions (Gatchaman, Speed Racer). Direção de Suzuki Toshimasa (Heroic Age). E series composition de Inotsume Shinichi (Akatsuki no Yona, Persona 5 the Animation). Contando a história de um planeta distante onde duas nações travam guerra em uma escassez de recursos.

No meio dessa guerra somos apresentados a nossa dupla de protagonistas. A princesa do Reino Soeil, Yuuki Soeil, e a soldado, Stella Shining, do Império Grandiiga. A história então, começa apresentando a princesa, vivendo em uma espécie de redoma de segurança, sem ter informações sobre a guerra no mundo exterior.

Essa redoma é quebrada quando seu amigo de infância, Joshua Ingram, morre no campo de batalha e é trazido de volta para o reino. E é aqui que começam meus problemas.

O inicial é o tamanho da série, claramente o roteiro não cabe numa série de 13 episódios. Precisava de no mínimo 26. E na ausência disso, o começo é absolutamente convoluto, com o anime apresentando uma tonelada de conceitos um após o outro sem tempo para que o espectador absorva qualquer um deles de maneira correta. Somos apresentados a essa sociedade, a nossa protagonista, ao par romântico dela, ao conceito da guerra, a escassez de recursos, a pedra mágica, e o amigo/par romântico morre, tudo isso num espaço de dois episódios.

É simplesmente coisa demais para se ter, deixando parte das informações confusas ou perdidas por parte do espectador. Além de uma ausência do vínculo entre nós e o Joshua para que sequer nos importemos com a sua morte. E então saltamos para a visão da Stella.

Falsa Simetria

Quando saltamos para o lado da Stella, somos apresentados a personagem mais interessante da mesma. Stella é uma órfã de guerra, que foi endurecida pelas dificuldades da vida. Mas ainda existe, em seu âmago, um resquício de sentimentos, presos ao passado. No entanto, a série não tem tempo para realmente trabalhar essa personagem além desse rabisco inicial. No máximo temos alguns breves momentos em que ela sorri ou chora, mas sem grandes catarses. O mesmo vale para a Yuuki, confrontada com a morte de seu melhor amigo e quebra de sua redoma. Acreditei que seria nesse momento em que a personagem seria obrigada a crescer, a deixar a infantilidade de lado. Mas nada disso acontece e ela permanece exatamente como começou, guerra é ruim, matar é errado.

Isso me trás a ideia base da narrativa de Price of Smiles. Tratar sobre a guerra e seus horrores. Existem dois problemas nessa abordagem. O primeiro é como ele é feito de maneira rasa, o anime nunca trabalha além de “guerra é ruim” e “todos na guerra são humanos”, uma temática absolutamente lugar comum nos animes de mecha.

Principalmente quando o primeiro é tratado com uma resolução infantil de tão simplória, com nenhuma justificativa durante todos os outros episódios. É um grande poder do amor, mesmo que tudo que nos foi exposto era uma sociedade movida pelo ódio do outro, pelo menos por parte dos militares.

O que me trás a segunda metade da mensagem “todos na guerra são humanos”, esse conceito, por mais que certo, carrega um problema em si. A falsa simetria de Prince of Smiles. Quero dizer, é só olhar para as protagonistas dessa história, uma princesa e uma soldado. Nota a diferença? De um lado, temos a figura máxima de autoridade daquele país, a palavra final. Do outro, temos uma soldado raso, de ranking consideravelmente baixo, e mais de uma vez tratada como bucha de canhão.

Essa distância no nível de moder causa uma dissonância na narrativa, em que o Império é claramente o lado errado, apesar de termos um esquadrão se esforçando, enquanto a monarquia é em essência boa, apesar do senado corrupto.

Uma guerra estéril

Por falar em monarquia, todo o personagem da Yuuki é um problema a parte. Não por ela ser inocente, mas por seu discurso e “ideais” se chocarem com o que nos é apresentado. Digo, todo o personagem dela é focado em fazer o que faz pelo povo de Soeil, mas quem é o povo de Soeil? Como eles se sentem em relação a serem governados por uma criança, que está claramente perdendo a guerra? Nada disso nos é mostrado, não sabemos como aquela sociedade funciona ou se organiza. E isso atrapalha tanto em sentirmos o peso daquela guerra, quanto em comprarmos a bondade irrestrita da Yuuki.

Afinal, durante todo o anime, ela está sempre fechada em salões discutindo com soldados de alta patente, ou com o senado. Ou com a mulher de um dos soldados dela. É só isso. Ela toma decisões, todos a advertem de que são decisões ruins, mas não vemos o resultado. Não vemos as mortes que as decisões dela realmente causam, por que mal são mostradas batalhas. Não vemos como o povo dela se sente ao ser evacuado das cidades, por que temos apenas um diálogo em off de recordatório. Tudo isso atrapalha e muito na construção de que a guerra é ruim.

Pra piorar a situação, temos as escolhas estéticas do anime. Todo o ornamento dos personagens é muito pomposo, muito estiloso, todos eles tem cabelos bem cortados, estão limpos e bonitos. Todo mundo é muito polido, até algum personagem morrer e eles terem uma catarse de 30 segundo nos final dos episódios.

Por falar em final dos episódios, uma coisa que me incomodou muito, foi quando eu percebi que a série ia se carregar de matar personagem em personagem nos cliffhangers. Ao ponto em que ficou enfadonho lá pelo episódio 8. Sempre era “personagem mostra deathflag, personagem morre com bastante sangue, Yuuki/Stella ficam tristes, repete o ciclo”. Eu me senti vendo Juuni Taisen novamente. E não foi como se as mortes trabalhassem as protagonistas. Nem como se o péssimo elenco de apoio fosse cativante, ou relevante para o roteiro, eles estão lá para serem mortos e prenderem o espectador para a próxima semana.

The Price of Smiles

Então, a série segue, personagens vão morrendo, a qualidade da produção vai caindo, e nós temos dois ciclos se repetindo. Do lado da Stella eles vão encontrar crianças, ela vai se lembrar que é órfã, e do lado da Yuuki, ela vai dar uma ordem de recuar querendo que ninguém mais morra, até o episódio 11 onde temos o plano derradeiro e agora spoilers. O plano final é fazer uma gigantesca bomba de EMP e desativar todos os chars, afinal, na conclusão da Yuuki, eles são o motivo das guerras.

Eu tenho vários problemas com esse final. A começar pelo fato de que a Stella pouco importa nele, ela meio que tá lá, o que me faz questionar qual o motivo dela sequer existir. Se o anime fosse focado apenas no lado de Soeil, talvez as mortes tivessem mais peso. Talvez a Yuuki fosse um personagem melhor.

Outro ponto é que nos é citado que os chars são a base da tecnologia daquele mundo. Mas nunca nos é mostrado até que ponto essa dependência vai. Toda a energia é gerada a partir dos chars? Eles servem só como um adubo? Em ambas as respostas, aquela sociedade está fadada a passar por um longo período de problemas e morte em escalas muito maiores do que a guerra proporcionaria.

E por último, em nenhum momento vimos qual foi a exata causa do início do conflito, nos é passado por cima que é algo sobre as pedras especiais, mas nada impede que um novo conflito se inicie agora por causa de comida, ou energia, já que a principal fonte foi eliminada. É como se no nosso mundo, a resolução dos conflitos fosse jogar todo o petróleo fora, talvez isso faça sentido na cabeça duma criança de 6 anos, mas de maneira nenhuma em um ambiente real.

The Price of Smiles tinha potencial de contar uma boa história com a Stella ou com a Yuuki, mas decidiu colocar as duas em simultâneo. Some isso a um elenco desinteressante, uma mensagem que já foi melhor explorada em praticamente qualquer Gundam, e um design desinteressante, e a receita para uma história ruim está completa. Mas me foi ainda pior por eu acreditar no potencial quando a série estreou, principalmente pela ausência de grandes produções com foco em mecha que temos atualmente.

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