The God’s Lie: Promessas de Verão – Review

The God’s Lie ou Kami-sama ga Uso o Tsuku é um mangá de volume único lançado em 2013. O mangá foi escrito e ilustrado pela Kaori Ozaki (Immortal Rain, The Golden Sheep). A publicação foi feita na Afternoon (Yokohama Kaidashi Kikou, Genshiken) e é um drama. No Brasil, o mangá foi publicado pela Panini em 2016.

Sinopse: Na escola para a qual Natsuru Nanao foi transferido, as garotas o ignoram. Certo dia, ele descobre o segredo de Rio Suzumura, uma colega de sala… A aventura secreta dos dois vai começar. (fonte: Guia dos Quadrinhos)

A vida é feita de uma série de mentiras e algumas poucas verdades. Algumas contadas por quem nos ama, outras por quem nos abandona. Ainda existem aquelas mentiras que contamos para nós mesmos, para que possamos seguir em frente.

E é dessas mentiras que se trata, ainda que parcialmente, The God’s Lie. Ao mesmo tempo, esse mangá é muito sobre crescimento. Sobre abandonar a infância e rumar para a adolescência. The God’s Lie aborda também um pouco sobre o primeiro amor de verão.

Falando um pouco do aspecto visual, a Kaori Ozaki manda bem demais. Traços sensíveis e precisos que passam tanto a leveza, quanto a dureza, que a história precisa. A quadrinização e narrativa é simples, mas bastante eficiente.

The Gods Lie 1

A história se abre com o nosso protagonista, Natsuru, em seus últimos dias antes das férias de verão. Ele é uma criança que sonha com ser jogador de futebol e não fala com as garotas, principalmente por elas não falarem de volta com ele. O Natsuru é um aluno transferido, que está a poucos meses no novo colégio, ainda em fase de adaptação.

O mangá então começa a, pouco a pouco, minar essa zona de conforto do personagem. O primeiro momento disso é justamente através do futebol. O Natsuru é um dos astros do time, um jogador de destaque, mas a chegada de um novo técnico começa a colocar tudo aquilo em cheque.

O técnico, licenciado pela liga japonesa, quer tratar o time do colégio como um verdadeiro preparatório. A história não diz explicitamente, mas fica bastante claro que o senhorzinho que cuidava do time anteriormente deixava os garotos levarem mais na brincadeira.

The Gods Lie 2

Acontece que, o jovem Natsuru não quer realmente se tornar um jogador de futebol. Ele quer sonhar em ser um jogador de futebol, da mesma forma que todos nós sonhamos em ser astronautas, ou roqueiros, ou pilotos de Fórmula 1.

É nesse ponto que parte do conflito interno do Natsuru se encontra. Nele entender o que ele quer de verdade com o futebol. Por parte da história, o garoto se questiona inclusive se ele sequer ainda ama o esporte. Mas o futebol não é um conflito isolado, jogar futebol (ou ser um esportista) acaba bastante entranhado com outras questão internas do personagem. Dentre elas como ele lida com a própria mortalidade.

Se de um lado temos o aparentemente sonhador Natsuru, do outro temos a Suzumura. Suzumura é uma garota realista até demais. E ela é assim por ter sido obrigada a amadurecer rápido demais. A garota principal de The God’s Lie, no alto de sua sexta série, se vê obrigada a morar sozinha com o irmão.

Isso faz com que ela não se possa dar ao luxo. Se dar ao luxo de sonhar com mais do que ser uma simples dona de casa. De poder comprar uma flor bonita, ou um doce gostoso quando da vontade. Ou mesmo de ter uma vida escolar normal. Nada disso, Suzumura não pode ser criança.

É curioso como The God’s Lie cria essa diferença entre os personagens sempre que pode. Dos trajes, aos trejeitos, passando até mesmo pelas alturas dos dois. É um trabalho muito cuidadoso para passar aquela situação complexa, sem nunca deixar passar do ponto e se tornar melodramática.

Afinal, uma parte importante de The God’s Lie é ele também ser um romance. E a jornada, doce e inocente, desses dois pré-adolescentes descobrindo um no outro, um apoio para crescer melhor, é feito de uma maneira tão delicada. Tão aos pouquinhos, que é impressionante que esse mangá tenha só um volume.

The Gods Lie 3

Mas The God’s Lie também é muito sobre mentiras. E pra comentar disso eu, obviamente precisarei entrar em spoilers, então vá lá, leia, e volta aqui.

Eu acho muito interessante como o mangá amarra o crescimento dos personagens com essa ideia das mentiras. Principalmente porque tanto a Suzumura quanto o Natsuru crescem justamente através da mentira dos pais deles.

Uma boa parte de crescer é deixar de enxergar os nossos pais como entidades quase divinas, para podermos velos como humanos. Humanos falhos assim como nós. Nesse sentido, acho bastante bonito o name drop do mangá ser justamente em uma dessas passagens.

Nela, o Natsuru, ainda bem pequeno, está visitando seu pai no hospital. O pai dele promete que, se ele for um bom garoto, o pai estaria curado. E essa é a Mentira de Deus, que dá nome ao mangá. Uma promessa impossível de ser cumprida, mas que propulsiona o personagem para ser alguém melhor. E justamente se re-encontrando com essa ferida aberta, visitando o antigo treinador no hospital, é que o Natsuru finalmente consegue fechar esse buraco do passado.

No espectro oposto temos a mentira para a Suzumura. No caso dela, o pai contou que iria para o Alasca pescar caranguejo, e que um dia voltaria para irem ao festival. Acontece que o pai nunca fora a lugar nenhum, e apenas abandonou os filhos com o avô por ter cansado de “brincar de casinha”. É uma quebra muito grande para o personagem da Suzumura, a personagem que se mostrava como a mais realista, era aquela presa pela maior de todas as fábulas. A fábula de que ela teria o pai de volta em casa.

The Gods Lie 4

A história então termina com uma passagem no tempo. O pai agora preso, e os irmãos no conselho tutelar. Certamente que a vida da Suzumura nunca será normal, mas assim como o Tofu, um gato que teve uma das pernas amputadas, ela aprendeu a se apoiar no que restava. E não a nada para se entristecer sobre isso.

The God’s Lie então nos apresenta uma última promessa, um reencontro dos dois, quando o Natsuru for um jogador de futebol. Essa promessa, como todas as outras da história, pode nunca chegar a se realizar. Mas o importante é que ela nasce de uma relação de afeto, e que busca que eles sejam pessoas melhores.

Eu fui completamente surpreendido por tudo que The God’s Lie conseguiu entregar. É uma história completa, com uma relação profunda, e uma temática forte. Definitivamente vale a leitura, caso consiga encontrar em algum sebo por aí. Figurando facilmente nos melhores quadrinhos que li esse ano.

E aí, leu The God’s Lie? Gostou? Odiou? Diz aí o que achou e, claro, qual o próximo mangá que deve aparecer por aqui.

The God's Lie 5

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