Natsu-Yuki: aproveitando o cotidiano – Review

Natsu-Yuki é um mangá de 3 capítulos lançado no Japão em 2018. Com arte e roteiro de Syuji Yukimoto (Kemoraifu, Same Girl) e publicado de forma independente, doujin. O quadrinho permanece inédito no Brasil.

Sinopse: Natsuno é um garoto comum, sem nada de especial ou extraordinário. Mas tudo isso muda drasticamente quando, no caminho para a escola, dá de cara com uma menina derretendo na calçada. Ichigo é uma mulher das neves, e uma amizade improvável surge.

Descompromisso e charme

Uma coisa precisa ser tirada da frente antes de entrar no mangá propriamente dito. Natsu-Yuki ser um doujin não faz dele um hentai. Inclusive fizemos um podcast muito legal sobre o assunto já. Inclusive, nem ecchi está presente em Natsu-Yuki.

Justamente por ser um doujin o mangaka recebe uma liberdade gigantesca. Basicamente o/a Syuji precisa responder apenas a si mesmo. Decisões boas? Mérito dele, ruins? Culpa dele. O revés dessa situação seria um trabalho muito enviesado, mas por sorte Natsu-Yuki sabe muito bem o que quer ser.

E ele quer ser um mangá gostosinho e descompromissado. Durante todos os seus três capítulos temos uma quase versão super acelerada de uma comédia romântica. Do encontro fatídico aleatório na rua, o capítulo da praia, o festival e o capítulo da piscina.

Todos esses momentos são levados com extrema leveza e bom humor, claro é uma comédia com os tropes, mas não tem um gosto amargo e sínico como a tentativa de subversão de um Oresuki da vida. Então Natsu-Yuki, por mais que seja uma obra pós-moderna auto-consciente, ainda abraça o bobo que o gênero permite, entregando com isso, uma história genuína.

O capítulo do festival

Dos três capítulos, o melhor com certeza é o segundo. Nele, Natsuo e Ichigo vão para um festival tradicional japonês. Toda a narrativa se desenvolve com o personagem do Natsuo tentando desesperadamente esconder que tem medo de fogos de artifício.

Enquanto isso, a personagem da Ichigo permanece, aparentemente alheia as preocupações do menino. Não preciso nem dizer que o Natsuo mente tão bem quanto a criança que é. Enfim, o garoto inventa desculpa após desculpa com medo da hora derradeira.

Quando a mesma chega, a Ichigo cria um tipo de isolamento acústico com a neve, e o garoto consegue ver os fogos. A escalada desse capítulo não é especialmente inovadora, tão pouco original, mas o trabalho é feito de maneira tão cuidadosa que a catarse é prazerosa demais.

Pegando uma tangente, esse quesito me lembra muito os elogios a Black Clover que tão frequentemente pipocam aqui ou ali nas redes sociais. Em sua maioria, os elogios dizem que “é genérico, mas pelo menos é rápido e direto”, algo que talvez seja o maior calcanhar de Aquiles do mangá. Se você não tem a sua disposição um roteiro original, a única coisa que te sobra é justamente a execução, algo que Natsu-Yuki entende perfeitamente.

E digo isso de forma mais abrangente também, o Syuji tem um controle narrativo muito bom. Sabe o quanto é necessário ser dito, e o quanto é melhor ficar omitido, entregando uma quadrinização limpa e diálogos orgânicos.

Complemento e contraste

Claro que de nada adiantaria um bom trabalho narrativo sem a força do elenco. Natsu-Yuki tem personagens simples, mas que funcionam bem juntos. A avoada Ichigo e o realista Natsuo são uma dinâmica muito bem construida nas poucas páginas do quadrinho.

Uma literal disputa entre o senso comum preso aos moldes da sociedade e o místico anárquico. Com todos os capítulos puxando a sardinha mais para o segundo, convidando o leitor a permitir-se mais aproveitar os pequenos momentos. O dia de piscina, a raspadinha, o banho de mar, ou até mesmo sair por aí como se fosse um boneo de neve.

Essa simplicidade nem sempre funciona no entanto, no final do dia, até pela sua duração, não sobra muitas características realmente marcantes da dupla. Eles são funcionais, mas nenhum pouco memoráveis. E o arco do Natsuo é uma levíssima linha que conecta os três capítulos sem realmente se concluir. Inclusive, de forma semelhante ao Dementia 21, o mangá termina em uma vírgula ao invés de um ponto final. A diferença é que o mangá do Shintaro realmente estava na metade, enquanto Natsu-Yuki, finalizado.

O verão e a neve

Natsu-Yuki não é incrível, revolucionário ou memorável. Mesmo assim em tempos tão conturbados como os nossos, ler duas crianças (quase) normais vivendo dias pacatos foi extremamente tranquilizante e acalentador.

Por ter um texto leve e desenhos charmozíssimos, acabou que o mangá era tudo que eu estava precisando para lembrar que eventualmente voltaremos aos eixos, e a humanidade seguirá em frente, com suas bobeiras, suas aulas e teimosias.

Então, leu Natsu-Yuki? Gostou? Odiou? Qual outro mangá tu quer ver por aqui?

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