I’m Standing on a Million Lives é Maravilhoso – Review

I’m Standing on a Million Lives ou 100-man no Inochi no Ue ni Ore wa Tatteiru é um anime de 12 episódios da temporada de outono de 2020. A série é uma adaptação do mangá homônimo, com roteiro de Naoki Yamakawa e arte de Nao Akinari. A adaptão foi dirigida por Habara Kumiko (estreante) e series composition por Yoshioka Takao (Elfen Lied, Zero no Tsukaima). A série é uma produção da Maho Film. No Brasil, a série é licenciada pela Crunchyroll e está disponível tanto dublada quanto legendada.

Sinopse: Yusuke Yotsuya, um aluno do fundamental distante e racional, é transportado para um mundo paralelo similar a um videogame. Ao lado de suas colegas de classe Iu Shindo e Kusue Hakozaki, ele é obrigado a encarar uma perigosa missão. Yusuke é frio e calculista, examinando cada situação sem se deixar levar pelas emoções, muitas vezes brincando com a vida de seus companheiros. Será que ele conseguirá proteger seu grupo dos monstros, armadilhas e esquemas que os ameaçam, e enfim vencer o jogo? (fonte: Crunchyroll)

Eu sou uma pessoa que aprecia muito chafurdar na lama. Não é atoa que faço parte do Vigilância Sanitária e semanalmente comentamos sobre desgraças da cultura pop japonesa. E mesmo para a minha pessoa, I’m Standing on a Million Lives foi um achado. É aquele alinhamento planetar que acontece, quando muito, uma vez por ano. Mas vamos por partes.

Começando no começo, nós temos nessa série o padrão mais do que batido de todo isekai edgy trevoso. Um moleque com problemas de comunicação, sem muitos amigos ou pessoas que importem de verdade. Repentinamente esse cara se encontra num mundo diferente onde ele é o herói, ele é importante, sua vida tem propósito. É mais ou menos nessa linha que Million Lives começa.

Só que, como a própria série reconhece, é um padrão um tanto batido, e Million Lives se vê mais inteligente do que isso. A série então decidiu dar seu próprio sabor nessa mistura, por algum motivo que me deixa atônito até hoje. A história decidiu que seria uma boa história se Re:Zero e Konosuba fossem uma coisa só. Exatamente isso que você leu, Million Lives é o que acontece quando você pega baixo orçamento, uma staff novata, Re:Zero e Konosuba, bate no liquidificador e despeja goela abaixo.

Não que a ideia em si seja completamente impraticável. Muito pelo contrário na verdade, se a série tivesse conseguido unir esses dois lados, provavelmente teria criado algo muito único. Mas no mundo em que vivemos, o resultado foi uma falha total.

Million Lives parece completamente alheio aos motivos que fazem qualquer uma das séries funcionar em primeiro lugar. O timing cômico é uma completa atrocidade, com piadas que você sabe que estão vindo a quilômetros de distância. Em outras vezes a direção não sabe sequer onde colocar o punch da piada, e um sentimento bizarro paira no ar. Você consegue ver a piada no texto, mas a imagem passou completamente alheia a tudo isso.

E para o lado Re:Zero da coisa (mesmo que eu não seja o maior fã do mundo) seria necessário um mínimo de profundidade no elenco, o que não poderia estar mais distante da realidade. Nessa primeira temporada temos cinco personagens de verdade na história. Os quatro heróis e uma companion que segue com eles por boa parte da temporada.

A companion é o personagem que mais se aproxima de ser algo. De resto, cada herói é um clichê com pernas diferente. Pegando como exemplo a Kusue Hakozaki: ela é uma garota frágil e doente no mundo real, que quer ser forte no mundo virtual pra compensar isso. Além disso o sonho dela é ser farmacêutica, pra poder criar remédio e ajudar os doentes. Quando somos apresentados ao drama da personagem, temos um comentário do protagonista sobre como “tudo isso é muito clichê”, e fica por isso mesmo.

Sim, eu sei que é um clichê, Million Lives, você apontar pra isso não faz ser melhor. Digo, talvez até faria se a série fosse levar isso como parte de sua comédia, mas não. Million Lives quer fazer inúmeros (pelo menos uns quatro) momentos dela pensando sobre quem é e se superando, com direção e enquadramentos super dramáticos e sérios. E melhor ainda é que a garota falha em todas as vezes, o que lhe rende o troféu de personagem mais patético de 2020, e gera humor involuntário.

Mas aproveitando esse gancho dos momentos dramáticos, talvez aí que esteja a parte mais engraçada da série. A total dissonância entre o que a série acha que está fazendo e o que a série faz de fato. Million Lives tem uma série de momentos com os personagens se questionando, sobre quem são, sobre suas motivações. No roteiro, é para serem grandes momentos de mudança pra eles, ao mesmo tempo que de aprofundamento. Mas os questionamento são sempre os exatos mesmos, o que só acaba demonstrando como os personagens são vazios.

Pra além do micro, a história faz o mesmo no macro. Grandes questões sobre justiça, sociedade, vida, morte, política e religião. Só que o texto é tão caricato e bobo, que só poderia ser uma paródia. Infelizmente o impossível as vezes se torna possível, e essas são as partes sérias.

Para exemplificar os grandes dilemas, eu preciso antes explicar como funciona a história de Million Lives. Ele é uma série dividida em missões, a cada tantos dias a party é transportada do mundo real para o outro mundo e lhes é passada uma missão e um tempo limite. Se eles não cumprirem, morrem de verdade. Caso cumpram, tem direito a fazerem uma pergunta.

A quarta missão (e maior) é que eles deveriam cobrir uma porcentagem do mapa e levar uma encomenda. Depois de procurar por uns dias, nossos heróis se encontram com uma carruagem sendo atacada por monstros. Achando que seria parte da missão, acabam resgatando a carruagem, só para descobrir que era um transporte de prisioneiros.

Eles são então apresentados com o seguinte dilema: levar os prisioneiros para serem executados ou não. Aquela poderia ser a missão, bem como poderia não ser. Para deixar “mais complexo” o grupo de prisioneiros eram compostos por um cara, uma criança e um padre. Million Lives então decide nos apresentar com um pouco de politicagem, e ficamos sabendo que naquele mundo, num reino qualquer, existem duas facções, as que amam o rei, e as que amam o rei e deus. E por isso eles vão ser mortos, porque só se pode amar o rei.

Eu pessoalmente amo esse tipo de não dilema, é a coisa mais óbvia do mundo que executar um padre idoso e uma criança não é nem minimamente aceitável. Pra além disso, só temos acesso a essa explicação porquíssima das “duas facções”, sem nunca sequer pisarmos no dito reino. O roteiro pensa que está sendo complexo, mas só parece uma criança de doze anos que é adultona demais para tomar Nescau com leite.

E isso que eu nem entrei na parte técnica da série, que é um show a parte. A animação é terrível, os personagens constantemente trocam de rosto durante a série. As lutas são absolutamente péssimas de se assistir, os golpes não tem peso, a coreografia é pobre. Por vezes a série quer dar um senso de fim de tarde, pra isso eles pegam um filtro laranja e aplicam o multiply no Photoshop. O anime está apinhado de um CG de péssima qualidade, que ele faz questão de dar infinitos close-ups. Por vezes o sangue das pessoas e criaturas é marrom, por algum motivo, em outras é um vermelho meio rosa brilhoso. Tem uma cena de dois personagens treinando, que depois é reprisada em flashback. Na primeira vez vemos ela de noite, no deserto. Durante o flashback, a cena está de tarde, no meio da floresta.

A trilha sonora é um quase plágio de Sword Art Online nos seus melhores momentos, e completamente genérica nos piores. O roteiro não tem qualquer noção de ritmo, episódios inteiros poderiam durar dois minutos, e cenas que duram poucos minutos precisariam de um episódio inteiro.

A série tem um sistema de jobs, que quando alcança o nível 10 permite uma re-rolagem. A uma primeira olhada poderia ser algo legal de se usar, mas do jeito que Million Lives utiliza só remove qualquer senso de identidade dos personagens. Na última missão da primeira temporada, de cinco personagens, 3 eram espadachins.

Pra fechar, uma entrada rápida em spoilers pra comentar o twist que mudou tudo e ninguém poderia imaginar que ia acontecer!!!

Depois de pelo menos uns cinco episódios com o protagonista repetindo a todo momento como tava tudo bem fazer tudo que desce na telha por se tratar de um mundo virtual, descobrimos que na verdade aquele nunca fora um mundo virtual, apenas uma outra possibilidade de Terra. Além do fato de ser meio óbvio de maneira geral, eu gostaria de dar uns passos para trás: o personagem não tinha qualquer motivo para acreditar que aquele era um mundo virtual. Eles sempre foram transportados de um lugar pra outro com um passe de mágico, e o mundo “real” ficava quase que parado no tempo quando eles saltavam. Sério, não faz o menor sentido ele simplesmente supor que era um mundo virtual.

E mais ainda, era muito claro que nenhum dos personagens com quem ele contracenou até ali se tratava de um NPC ou algo do gênero. Então quando ele literalmente ateia fogo a um deles e vê ele morrer queimado, é meio bizarro o personagem simplesmente ignorar “por ser virtual”. Mas tá aí, grande twist que eu já vi em ao menos uns cinco outros lugares, e todos executaram melhor, inclusive no fato choque.

É tudo tão caricato e tosco que, poucos episódios depois, o protagonista enfrenta um monstro das neves. Depois de derrotar a fera, aparecem os filhotinhos chorando em cima do cadáver do pai, só para o protagonista responder como ele não se importa, já que é tudo virtual.

Não existe sequer um aspecto de Million Lives que não seja péssimo. Do começo ao fim, passando por roteiro, ritmo, personagens, animação, character design. Tudo é feito de maneira porca, mesmo que a história legitimamente acredite o contrário. E é justamente por tudo isso que foi uma experiência completamente maravilhosa de se ter. Se algo vai ser um lixo, que ao menos seja um lixo completo, e I’m Standing on a Million Lives excedeu minhas expectativas nesse sentido. Estou mais que pronto pro lançamento da segunda temporada no meio do ano que vem.

E você, assistiu I’m Standing on a Million Lives? Gostou? Odiou? Diz aí o que achou e, claro, qual o próximo anime que deve aparecer por aqui.

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