Getter Robo: Conexão da Humanidade – Review

Getter Robo é um mangá de 4 volumes (posteriormente reeditados em 2) lançado em 1974 no Japão. O mangá é uma criação conjunta de Go Nagai e Ken Ishikawa, este segundo que posteriormente escreveu e desenho a obra. O mangá tem uma série de continuações que formam a Getter Robo Saga, mas essa review é só do original. Getter Robo permanece inédito no Brasil.

Sinopse: Milhões de anos atrás, o Império dos Dinossauros dominava a Terra. Tudo isso mudou, quando o sol começou a projetar os Raios Getter, que eram altamente danosos para os Dinossauros, que decidiram mergulhar no centro do planeta para sobreviver. Anos se passam e eles retornam no Japão atual, e cabe ao Getter Robo ser a última linha de defesa da humanidade.

Getter Robo é uma série difícil de se analisar. Por mais que eu tenha algum contato com mangás antigos, não sou exatamente um especialista no assunto. Dito isso, até mesmo eu sei da contribuição do mangá para o gênero mecha. Ele foi o primeiro a introduzir o gattai técnica na qual vários robôs se conectam para formar um mais poderoso.

Mesmo sem o conhecimento prévio dessa informação, só desse mangá original já dá pra ver bem delimitado de onde tantos outros trabalhos se inspiraram. O mais notório deles é o próprio Gurren Lagann.

E de certa forma é bastante impressionante esse mangá ser da metade dos anos 70. Digo isso porque, roteiro a parte, o traço do Ken Ishikawa segura muito bem. Mesmo a narrativa e os diálogos não soam datados, considerando que o quadrinho tem quase cinquenta anos.

Inclusive, para os amantes do terror, Getter Robo é um prato cheio. Mesmo sendo uma história de mecha, o Ken Ishikawa gasta longas sequências para mostrar o terror do império dinossauro. Seja através de uma quase transformação zumbi logo no começo, com uma involução dos humanos em símios, ou com as diversas cidades completamente devastadas durante os pouco menos de 15 capítulos.

Outro aspecto que é um deleite visual é nas caras e bocas dos personagens. Pelo traço menos realista, o Ken Ishikawa consegue distorcer os rostos dos pilotos de uma forma amedrontadora. Assim, mesmo que o Getter Robo seja um robô absolutamente capaz, não perdemos de vista que os pilotos são apenas uns moleques que o Professor Saotome encontrou no mato.

O terceiro pilar visual que faz desse mangá tão charmoso é justamente os monstros. Getter Robo te promete um Império de Dinossauros, e ele entrega. Cada criatura jurássica e mecânica apresentada é mais interessante e elaborada que a anterior. O próprio Imperador Gore é um design simplesmente maravilhoso. Raros são os monstros que você olha e pensa “é, esse foi só ok”. O mesmo vale para os cenários da história, sempre hiper detalhados, o que ajuda a dar um senso maior de realidade pro roteiro.

Falando dos três pilotos, eles variam bastante de qualidade. Nós temos o protagonista, Ryoma Nagare, que é o clássico do clássico. Ele é o mestre em artes marciais, habilidoso com armas, pau no cu e bom piloto. O Ryoma é o personagem que passa pelas maiores desgraças desse mangá, apesar de Getter Robo não estar realmente interessado em trabalhar conflitos psicológicos dos personagens. Se quisesse, esse personagem poderia ter se tornado icônico pra mim, do jeito que foi, apenas funcional.

O segundo do time é o Hayato Jin, um líder do sindicato dos estudantes que formou uma guerrilha. Ele é o personagem mais apagado do trio, no começo ele é para ser o cérebro do grupo, mas rapidamente o personagem se torna uma redundância do próprio Ryoma.

E em terceiro temos o coração do Getter Robo, que é o nosso saudoso Musashi Tomoe. O Musashi é o personagem cômico, ao mesmo tempo em que ele é o leitor. Dos três, é o único que não pilota por dever, mas por querer pilotar. Ao mesmo tempo é o pior piloto dos três. Ele é bastante carismático, e o único que tem um arco completo já nesse primeiro mangá.

O quarto personagem é o próprio Imperador Gore, que tem um breve momentinho no último capítulo e foi excelente. Gosto demais como o fechamento do personagem é uma apresentação de uma nova ótica para aquele conflito, que enriquece tudo aquilo, ao mesmo tempo que deixa muito mais cinza. Com um capítulo, Ken Ishikawa conseguiu humanizar mais dinossauros humanoides que muito quadrinista por aí consegue num quadrinho inteiro.

Mas se digo que é complicado analisar Getter Robo, é justamente por causa de seu roteiro. Ele segue a filosofia de, por exemplo, Cavaleiros do Zodíaco, ou Hokuto no Ken. Os personagens estão mais ou menos prontos e fixos, e os conflitos são sempre externos. Então mesmo que o Kenshiro tenha o drama dele com a perda da amada, as cenas de desgraça são o que move ele no momento a momento.

Isso faz com que, por vezes, acabe faltando aquele passo a mais em Getter Robo. Aquele momentos dos personagens olhando mais para dentro de si e refletindo sobre aquilo que se passou. E não digo isso num olhar de “é uma bosta por não ter”, é mais uma sensação de desperdício, de que já é ótimo mesmo sem ter esse extra.

Ainda mais que o mangá, especialmente no começo, está bastante focado em mostrar como as ações da equipe do Getter Robo são extremadas demais. Em dado instante, o Hayato quer explodir um laboratório cheio de humanos modificados. A justificativa do personagem é que aquilo pode causar a morte de toda a humanidade, e por isso valia a pena matar os já alterados.

Só que Getter é, na maior parte do tempo, um mangá episódico. Então esse conflito, assim como outros, acaba confinado dentro do próprio capítulo. E novamente, o problema é que são conflitos muito bons, que facilmente trariam dinâmicas interessante e mudanças inusitadas na gerência da equipe. Mas Getter está mais interessado em apresentar o próximo conflito, e o próximo monstro.

E mesmo com esse, meio grande, porém, Getter Robo ainda trabalha bem demais a situação limítrofe que ele impõe. Um momento especialmente excelente é quando um momento de birra no time faz com que eles percam o controle das naves e isso causa a destruição de uma cidade. O resto do capítulo é o Ryoma entrando em contato com as crianças sobreviventes daquele lugar.

Esse é, provavelmente, um dos capítulos mais pesados do mangá. E ainda mais, o Ken Ishikawa não se polpa de terminar num sentimento de derrota. Não importa o que o esquadrão faça, aquela cidade não vai voltar. E é através desses momentos que o mangá consegue construir o peso e a importância do Getter Robo.

Importância inclusive temática. O Getter Robo é movido a Raios Getter, a mesma energia que expulsou os dinossauros. Essa energia foi o que fez a humanidade evoluir, ao menos no universo de Getter. Então, literalmente o robô que protege a humanidade é a evolução tecnológica da mesma.

Getter Robo é um símbolo da evolução humana, por isso mesmo precisa ter mais de um piloto o tempo todo. A força da humanidade está no desenvolvimento tecnológico, e esse desenvolvimento não pode ser dado sem um coletivo e uma conexão.

E justamente por todos esses motivos que o primeiro arco é contra o Reino Dinossauro. Eles representam o atraso, o bruto, o animalesco. Getter Robo então passa a, durante todo seu mangá, mostrar como a linha que separa a modernidade e o pré-histórico não é tão definida assim. E isso se culmina no último capítulo, quando somos colocados na pele do Gore, e vemos que, no final das contas, não eramos assim tão diferentes. E a barbárie está sempre a espreita da humanidade.

Infelizmente com isso eu fui completamente amaldiçoado. O final de Getter Robo não é um final per se, mas sim um cliffhanger para o próximo mangá. Como gostei muito dessa releitura, decidi cair nesse abismo de vez. Então semana que vem estejam preparados para a segunda parte dessa review gigante. Essa review que é secretamente a primeira parte da jornada pela Getter Robo Saga!

E ai, leu Getter Robo? Gostou? Odiou? Diz aí o que achou e, claro, qual o próximo mangá que deve aparecer por aqui.

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