Zipman entrou mudo e saiu calado – Review

Zipman é um mangá de 2 volumes lançado no Japão em 2019. Com arte e roteiro de Yuusaku Shibata (Sahara the Flower Samurai, Yoakemono), o mangá foi publicado na Weekly Shonen Jump (Samurai 8, Boku no Hero Academia). O mangá permanece inédito no Brasil.

Sinopse: Kaname Tatara é um colegial viciado em Jackman, um tokusatsu famoso daquele universo. Seu sonho é fazer parte de alguma das séries, para trazer alegria ao rosto das pessoas. No entanto sua face assustadora o faz ser rejeitado em todo e qualquer teste, sendo sempre oferecido o papel de vilão. Mas sua vida dá uma guinada, quando um robô gigante ameaça destruir a Torre de Tóquio…

Deslocado no tempo

Zipman foi uma experiência curiosa de se ter. Acompanhando semanalmente parecia claramente que era um trabalho meio perdido, sem propósito, sem um espaço na Shonen Jump de 2020.

Digo isso por ver no mangá um ar muito bobo, até mesmo simplório, talvez tendo um espaço na revista na década passada ou na antes dessa.

De qualquer maneira é um mangá que teve seu aval de lançamento e um começo até promissor. Inclusive o primeiro capítulo permaneceu sendo o melhor da publicação, dando espaço para a narrativa respirar e apresentar seu conceito aos poucos.

O conceito em si também é muito interessante, de desenvolver um tokusatsu moderno em mangá. A problemática disso é a concorrência direta como já supracitado Boku Hero, mangá com muito mais popularidade. Mesmo que não seja fundamentalmente igual, é próximo o suficiente para jogar contra a série do Shibata. Dito isso é visível o amor que o autor carrega sobre o tema, com uma tonelada de referencias a outras franquias, das mais óbvias como um inimigo que mimica Cutie Honey, as mais discretas como uma arma que lembra a transformação do primeiro Kamen Rider.

Mesmo com tantas referências, o universo de Zipman soa feito de plástico. Em um mundo onde parece haver mais valor o lore de uma história do que sua narrativa, isso também trabalha contra o mangá. A soma dos três fatores pode ter sido um pilar do cancelamento, mas não foi o único.

Kaname Tatara

Mangás são uma mídia serializada. Isso é uma característica marcante da mesma e a altera, tanto para o bem, quanto para o mal. Principalmente em revistas com alta rotatividade, a interação com o público é vital em definir se uma história será ou não concluída. Isso significa que, mais do que em outras mídias, o mangá precisa de uma conexão dos leitores desde o primeiro capítulo.

Kaname Tatara é um empecilho nesse sentido. Por ser um personagem um tanto quanto inconveniente, a chance do público se afeiçoar a ele teria de ser no decorrer da publicação. Ele não tem trato social, tá sempre gritando, não é visualmente interessante, não é cool e contido. Lembra muito mais um personagem secundário cafona das partes iniciais de Jojo’ Bizarre Adventure que um protagonista moderno de battle shonen. 

Mas, para além dos problemas com o público, Kaname é um problema em si próprio. Todo o arco do personagem dele se calca em querer trazer felicidade para as pessoas, mas não saber como. Em contra partida temos o Koshiro Tatara, seu irmão gêmeo que sabe muito bem como tratar com as pessoas, mas não consegue ter iniciativa de agir. Dessa união que surge o herói completo, Zipman.

Até aí tudo bem, seria um mangá que trataria sobre esses dois personagens absorvendo o melhor do outro e se tornando um herói completo. Só que esse arco nunca acontece, digo, eles desde sempre enxergam apenas no outro as qualidades e em si próprios os defeitos, sem nunca absorver o que falta em si próprios e com isso crescerem como indivíduos.

Pior ainda, em um ponto de virada o Koshiro é sequestrado e ao invés desse momento ser uma ruptura para o Kaname, a história simplesmente entrega para ele um power up fácil e rasteiro. É como se Zipman, a série, quisesse, ao mesmo tempo, dizer que o Kaname é um herói em crescimento e um herói completo.

Poder e anonimato

Uma outra temática forte da obra é sobre poder e anonimato. Basicamente todos os personagens da Organização são, além de homenagens a outros tokusatsus, heróis da própria história. Todos eles acreditam que estão fazendo aquilo pelo bem da sociedade e para criar um mundo mais justo.

E isso se amarra com a mudança de tratamento que o próprio Kaname recebe. Enquanto vestido de herói, ele pode ser direto, brega e fazer suas poses que é recebido com aplausos. Já se estiver vestido de civil, acaba sendo ostracizado pela sua aparência animalesca.

O grande problema é que essa temática nunca é fechada, o vilão final possui um design que mistura o fofo e o bizarro, mas Zipman nunca mostra de fato a que veio. Perde-se muito tempo nessa perna final entre o Zipman e o Anti-Zipman (é sério) do que desenvolvendo o plot e/ou os personagens e seus temas.

Também não ajuda que a luta em si não seja nada demais. Mesmo para uma série com um traço acima da média, é bastante triste que seu auge de narrativa e quadrinização de combate seja entre o Zipman e a personagem que é um rip-off de Digimon, ainda na primeira metade do mangá.

O mangá ainda chega a tangenciar a questão de como é bobo tentar planificar a sociedade entre mocinhos e vilões (um beijo Alan Moore), mas é outra questão levantada e não tratada. Essa é ainda menos desenvolvida que a de poder e anonimato, não consigo nem afirmar que foi algo feito com intenção de ser uma crítica, ou se foi só um acidente.

Zipman

Eu gosto do trabalho do Shibata em Flower Samurai. É uma aventura divertida, com personagens carismáticos, muito bem conduzida em 1 voluminho fechado. Talvez, assim como seu parceiro de Jump, Boichi. O Shibata funcione apenas com publicações curtas, como one shots e coisas do gênero.

De qualquer maneira eu não consigo nem afirmar que Zipman é um mangá horrível, ele é pior do que isso, ele é inexpressivo. Mais um pra gigantesca pilha de trabalhos que não serão lembrados nem daqui dois meses, quem dirá ano que vem.

Eu já me vejo olhando para a capa dele na minha lista de concluídos daqui uns ano com o pensamento de: “nossa, verdade, esse mangá existiu e eu li ele ainda por cima”, junto de outros clássicos dos quadrinhos, tipo Alive. De qualquer forma, não deixará saudades, e já foi tarde, adeus Zipman.

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