Akaboshi foi cancelado injustamente? – Crítica

Akaboshi foi um mangá lançado no ano de 2009 na Weekly Shonen Jump (Dragon Ball, One Piece). A obra foi escrita e desenhada por Yoiuchi Amano (Ana no Mujina, Over Time) tendo sido cancelada em seu terceiro volume. O mangá permanece inédito no Brasil.

Akaboshi conta a história de Taisou Ryuusei, um garoto que vive num período conturbado da China. Um período em que um regime autoritário consome o país e leva o povo à pobreza, enquanto seus governante esbanjam nos palácios da capital. Taisou então faz parte da Taiten-Gyoudou uma trupe de bandidos bondosos, uma variante do mito do Robin Wood oriental.

Um fracasso memorável

Existe uma história que provavelmente sempre se repetirá, enquanto a Shonen Jump existir. Um leitor novato, se empolga com a mídia e decide começar a acompanhar a TOC. Para isso, decide ler o máximo que conseguir de séries em publicação na revista. Invariavelmente, mais cedo ou mais tarde, o leitor acaba se apegando por uma obra renegada pelo público, e passa a gritar aos quatro ventos como o mundo é injusto.

Afinal como pode haver justiça em um mundo que permite a existência de Bleach ou Naruto ou seja lá qual é o título popular de qualidade duvidosa da vez, enquanto joga essa joia aos leões. Isso foi dito sobre muitas coisas ao longo da minha passada pela revista, certamente era dito antes e será depois. Hungry Joker já foi conhecido por isso, mas talvez o mais emblemático ainda seja Akaboshi.

Então, nada mais justo do que entregar para essa obra o benefício da dúvida, mesmo que mais de uma década depois, cá estamos para responder a pergunta: afinal, Akaboshi mereceu que a guilhotina cantasse e seu pescoço ficasse mais leve?

Bom, mereceu. Mas vamos com calma!

Um pouquinho disso, outro daquilo

Antes de entrarmos de fato na narrativa de Akaboshi, seria interessante comentar um pouco sobre o visual do mangá. O traço de Akaboshi é inconstante, algo um tanto comum para autores estreantes de maneira geral. De capítulo à capítulo e, eventualmente, dentro do mesmo capítulo, a arte vai do medíocre ao excelente.

Isso acontece por dois motivos. Primeiro por causa da falta de experiência do senhor Amano em produção de uma série. Segundo porque o mesmo gosta de experimentar com o traço, principalmente em cenas de impacto. Por vezes, para causar um maior dinamismo, ele opta por uma arte quase que aquarelada (ainda em pb), que é um absurdo. Infelizmente, até por questões de tempo, seria impossível produzir num ritmo semanal com o estilo, que acaba preso a quadros ou páginas duplas. No entanto, a variação opera em favor, e os momentos realmente impactam toda vez que surgem.

Mas se o traço varia, o mesmo não pode ser dito das composições. Talvez o maior trunfo de Akaboshi seja suas cenas de ação, sempre limpas e dinâmicas. Um grande feito, considerando o quando os character designs são detalhados. Mesmo assim em momento algum durante a leitura você se sente perdido, mesmo com o roteiro saltando entre núcleos. Fica sempre bastante claro quem está onde.

O traço do Amano em Akaboshi é sua maior força, e curiosamente é como se o Hiroyuki Takei e o Ryu Fukisaki tivessem tido um filho.

Um protagonista fraco

Em contraposição, talvez o ponto mais fraco seja justamente seu protagonista. Taisou é um gigantesco problema dentro da narrativa de Akaboshi.

O primeiro grande problema de Taisou é a falta de controle do roteiro para com sua personalidade. Por vezes um protagonista inocente padrão de battleshonen. Em outras um cara meio edgylord e sarcástico com leves toques de sadismo. As duas faces de Taisou poderiam se comunicar, poderiam ser um garoto que coloca uma máscara para esconder seu lado mais frágil do mundo. O problema é que não é o que acontece, a falta de domínio por parte do texto faz com que ele pareça ter duas personalidades disjuntas, deixando o personagem com duas metades pouco exploradas, ao invés de uma unidade bem construída.

Mas não para por aí, pra além disso, toda a motivação do Taisou é muito fraca. O leitor nunca realmente se conecta com o que ele quer. São frases exparsas em quadros pequenos que revelam o desejo de vingança do protagonista. Mas nada disso nunca é de fato dramatizado, até ser tarde demais. Acaba ficando muito difícil que o leitor compre a briga dele, se invista na história. Entendo que a ideia era causar um ar de mistério e não se prender muito a uma linha reta de vingança, mas acabou jogando contra o mangá. E não é como se fosse difícil de fazer algo do estilo, Fairy Tail faz melhor. Uma boa parte, tanto do primeiro capítulo, quanto dos próximos do mangá do Mashima se focam em estabelecer a busca do Natsu pelo pai, e o mangá não é nem um pouco menos aberto por causa disso.

De nada ajuda também o quão tangencial a trama de vingança e o grupo do Taisou faz parte se conectam. Sim, eu sei que eventualmente demonstra que o alvo de vingança é do alto escalão do império, mas esse tipo de coisa precisava ter sido mais fortemente estabelecida logo cedo. Ou que fizesse uma história que começasse pelo recrutamento do Taisou. Em vez disso passamos noventa por cento do mangá vendo arcos enfadonhos, que nada se relacionam com os objetivos do protagonista da história.

O desespero do cancelamento

Vida que vai, vida que segue, então alcançamos o capítulo 10. Poucas vezes na história dos mangás cancelados eu me deparei com um desespero tão claro de cancelamento. Basicamente do mais absoluto nada a história decide que seria uma boa fazer uma página de abertura de capítulo com todas as personagens de biquíni, curtindo uma praia, tomando sorvete.

Sim, uma história de época não impediu o autor de abrir um capítulo assim. Muito menos impediu de no mesmo capítulo introduzir uma personagem cuja única função é ser gostosa demais. É completamente bizarro porque Akaboshi não tinha ecchi até esse ponto, mas decidiu que agora seria uma boa hora para começar.

Daí pra frente, o que era razoável começa a desmoronar em direção ao abismo. Capítulos de introdução de personagens aos montes, naturalmente sem qualquer espaço para mostrarem a que vieram. E o mangá entra no seu arco final.

O arco final é uma tomada de uma fortaleza para o bando chamar de lar. A estrutura desse arco é uma bagunça, ele começa como um exame, salta para torneio e termina num corredor de inimigos. Tudo isso em menos de 14 capítulos. E mesmo faltando míseros dois capítulos para a guilhotina, o autor continuou abrindo a história numa esperança vã de salvar o mangá. Nem preciso dizer que ele não fecha absolutamente nenhuma ponta.

Castelo de areia não suporta a onda

Com todas as peças prontas, vamos falar um pouquinho do arco final. Além da já dita bagunça, ele pede que você se importe muito com o bando, mesmo sem que tivéssemos tido qualquer tempo para sequer conhecê-los. No máximo o mangá nos deu a rivalidade entre o Taisou e o Rinchuu, mas espera que nos importemos com todos os 20 personagens. Não opera a seu favor a personagem feminina mais relevante ser completamente jogada de escanteio.

Mas falando do arco em si, a escalada de nível de poder dentro dele é bizarra. Me faz quase querer ver a realidade na qual esse mangá se salvou. Porque com uma escalada dessas, ele estava fadado ao fracasso no máximo uma dúzia de capítulos depois.

E falando de escalada, temos o clássico power-up do protagonista. Veio por uma questão interna? Treinamento? Desenvolvimento de personagem? Obviamente que não, veio apenas por necessidade do roteiro mesmo. Já que mesmo nessa altura ainda não tinhamos nenhuma noção do passado do Taisou.

Então o arco acaba com os vilões fugindo, o Taisou sai voando em um deles e caí de frente com o alvo da sua vingança. Eu estou falando muito sério aqui, foi isso que aconteceu. E entramos no flashback.

Realmente me faltam palavras para falar desse flashback. Ele é ruim, muito ruim. Nunca saberemos se era a ideia original, ou fruto do desespero, mas não importa. O que importa é o que temos, e nós temos basicamente o flashback da Nami, só que mal executado.

Protagonista adotado por um pai solteiro e pobre que acaba sendo morto pelo seu vínculo com a criança, mesmo que ela renegue o laço momentos antes. A diferença é que nunca temos o momento do laço entre pai e filho aqui, o Taisou tá sempre sendo um pau no cu com o pai por “ser afeminado”. Daí ele morre, traído pelo cara do mal que literalmente come a cabeça do pai do Taisou.

As 108 estrelas do destino

Falando em traição, Akaboshi é um tanto quanto tematicamente confuso. Em vários pontos do mangá, se bate o martelo sobre traição vs lealdade. Basicamente todos os personagens funcionam com essa dualidade, são definidos por traições que sofreram e por a quem são leais. Até mesmo o Taisou.

O problema é que no final das contas, o roteiro decide arrematar a história falando sobre como a esperança sempre será passada as próximas gerações. Mesmo que isso não tenha nenhuma conexão com o que é abordado durante os outros 23 capítulos.

Inclusive o último capítulo é uma vergonha. O autor gasta metade dele fazendo um grande traveling mostrando vários personagens que recebem as estrelas do destino. Personagens que não conhecemos, mas provavelmente ele já tinha o design em mente. Ao invés de focar o último capítulo do seu mangá no seu protagonista. Ou mesmo no grupo dele, o roteiro acha mais importante fazer teaser de uma continuação que nunca vai existir.

Akaboshi poderia ter sido algo, acabou sendo menos que nada.

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