Sensei no Bulge é um proto Boku no Hero

Sensei no Bulge é um mangá de dois volumes lançado em 2012. O mangá é a segunda serialização de Kouhei Horikoshi (My Hero Academia, Oumagadoki Doubutsuen), tendo sido publicado na Weekly Shonen Jump (Medaka Box, Dragon Ball).

Sensei no Bulge foi lançado com o nome de Barrage pela Viz americana, permanecendo inédito no Brasil (apesar de ter carinha de JBC).

Enfim, o mangá fala sobre Astro, um moleque que vive nas ruas da capital do reino de Indústria. Uma série de eventos faz com que ele troque de lugar com o príncipe local e precise se tornar o herdeiro do trono.

Conheça o passado para entender o presente

Meu interesse em ler Sensei no Bulge foram principalmente dois. O primeiro era entender melhor como funciona o processo criativo do Horikoshi. O segundo era aumentar minha catalogação de cancelados da Jump. Felizmente Sensei cumpre ambas as funções com maestria, mas vamos com calma.

Primeiro falando enquanto o Horikoshi, não é lá muito segredo que não morro de amores por Boku no Hero. É um tanto curioso quão similar Sensei no Bulge é em alguns dos quesitos. Digo, não era de se esperar que um autor que não consegue trabalhar bem cenas de ação tivesse desaprendido. Era muito mais natural que ele nunca tivesse desenvolvido.

Como é de fato o caso. As lutas de poder de Sensei no Bulge são muito sem graça. Não só por serem simples, mas porque o autor não tem ideia de como fazer uma lança e uma espada serem minimamente interessantes. A maior parte delas se resolvem com um porradão, falta dinamismo, impacto, diversidade. 

No quesito do plot, também tem muito de Boku no Hero. Trocando um elenco interessante por um plot de missões sem a menor graça, tanto aqui quanto lá, o forte está na interação dos personagens. Ao menos no mangá de sucesso a classe é melhor aproveitada que o elenco do castelo, basicamente descartado no capítulo 4.

Mas no que ele mais assemelha com Boku no Hero é a troca do interessante pelo lugar comum. Um protagonista que podia ser tanto, mas é um clichê com pernas. Mais sobre isso a frente.

O princeso e o plebeu

O conceito de Sensei no Bulge é bastante promissor. Toda a ideia de um fodido e um monarca trocarem de lugar e o olhar da outra realidade faz com que eles cresçam enquanto pessoas não é nada novo. Até filme da Barbie já explorou esse conceito.

Só que a abordagem do Horikoshi tem alguns problemas. A começar pelo Astro, ele ter vindo do setor pobre influi muito pouco na personalidade do mesmo. Ele continua sendo o protagonista inocente de sempre. Algo que seria muito mais próprio para o príncipe que nunca pode deixar o castelo.

Digo, ele poderia ser politicamente inocente. Mas parece que ele teve uma vida absolutamente tranquila, quando ele cai em absolutamente todo e qualquer papo. Um personagem mais safo renderia dinâmicas palacianas mais interessantes. E aí está o outro problema, toda a questão de reinado e nobreza é descartado quase que imediatamente por uma lógica de missõezinhas.

Isso é obviamente um erro grotesco por parte da história. Jogar fora seu aspecto único e apostar em ser mais um battle shonen qualquer dentro da revista, não é de se admirar que a degola chegou.

Outra questão: apesar de corajoso, matar o príncipe logo de cara acabou se provando um erro, por abrir mão de traçar paralelos de como cada personagem encena a vida do outro. Inclusive toda questão da encenação é resolvida muito de bate pronto também. É quase como se o autor se recusasse a seguir em frente com os conflitos que ele mesmo estabeleceu. Só que no processo, ele foi trocando conflitos interessantes e únicos… meio que por coisa alguma.

Jornada para o oeste, ou não

Então começamos a jornada, ou seja, todos os irmãos, o laço emocional entre leitor e protagonista ficam esquecidos. O conflito do impostor já não existe mais. Toda a ideia que é pincelada de uma nobreza escrota é basicamente esquecida. Pelo menos ele tem uma lança legal.

Mas nosso querido Astro não viaja sozinho, ao lado dele temos o fiel guarda real, Tiamat. Tiamat é um caso interessante, principalmente por ser o personagem melhor desenvolvido do trio (?) principal. De mentor que não acredita no pupilo à companheiro de armas. Não que seja nada novo nem que ele seja um grande personagem, mas dá um sabor a mais no caldo sem gosto que é Sensei no Bulge.

Algumas missões sem sal depois chegamos no primeiro (e único) grande arco de Sensei no Bulge. É neste arco que somos apresentados a Uraraka do mangá, Tico. Tico é uma órfã de guerra que foi acolhida por um casal de velhinhos e busca vingança pelo assassinato da mãe adotiva.

Afinal quando chegamos na cidade descobrimos que ela foi tomada por bandidos e a guarda virou uma milícia que governa a cidade e reporta falsamente para a capital. Qualquer semelhança com alguns estados brasileiros é mera coincidência.  Enfim, é nessa altura que somos apresentados ao retcon, que na verdade Astro teve um pai adotivo também, que se chamava Black e tinha chifres, curiosamente parecido com a silhueta do líder da milícia, uma curiosa coincidência certamente.

Crônicas de um mangá cancelado

Provavelmente foi por volta dessas viradas de arco que informaram ao autor que a obra corria risco de cancelamento. Digo isso porque nesse momento o mangá faz uma curva pro lado darks, com morte de personagens e escravização de crianças. Obviamente não rendeu frutos e ele acabou degolado mesmo assim.

Enfim, a Tico tinha sinais de que seria um personagem interessante até, infelizmente termina sendo bem subutilizada dentro do próprio arco. Porque somos informados do sistema de poder de Sensei no Bulge, energia escura. Sim, a mesma que existe no nosso universo e não conseguimos utilizar. Um bom conceito porcamente utilizado, a essa altura já não havia mais salvação, mas mesmo assim não teve sequer uma boa ideia de poder.

Eis que temos o momento de superação do protagonista, que ganha um power-up, agora com uma espada que estica e não tem nenhuma diferença prática da lança, mas sei lá né. Taimat e Astro então se dirigem para o castelo e WOW, quem poderia imaginar, realmente era o pai adotivo do Astro o vilão esse tempo todo.

E é nesse momento que temos a virada idiota 101, na verdade o Astro era o príncipe o tempo todo, ele foi trocado quando bebê. O que isso implica para a história? Nada, digo além de perder a força do personagem conseguir usar a lança fodona mesmo sem sangue real. Mas deve ter parecido uma boa ideia na hora.

Enfim, discurso do pai sobre como a nobreza é podre, o povo é podre e por isso ele quer derrotar todo mundo. A essa altura a temática já havia se perdido, mesmo assim é legal que ele ao menos olhou novamente pra isso, nem que seja nos últimos minutos do segundo tempo.

Um Mashima de sutileza

 

Dito isso, achei curioso como Sensei no Bulge é semelhante a Eden’s Zero. A todo momento o protagonista do mangá do Mashima fica citando que o tema da história é amizade, de forma semelhante, o do Horikoshi fica batendo na tecla da família. Um tanto bizarro que ele insiste tanto que família não precisa ser de sangue, mas no final ele é o filho legítimo do rei. Às vezes o twist vale mais que o sentido.

Enfim, pode parecer que odiei a leitura de Sensei no Bulge, mas foi muito pior que isso: foi uma leitura medíocre. Ele é um grande exemplo do sem sal, do passável, do esquecível. Então se eu recomendo? Claro, vá em frente, se quiser conhecer mais do passado do autor do seu battle shonen do coração. Pra além disso, tem uma tonelada de cancelados muito mais interessantes para se ler.

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