A verdade em Final Chapter: Tsukihi Phoenix

No texto passado, eu fiz uma alusão ao fato de que a série Monogatari conta com inúmeras conclusões. Tsubasa Cat por si só, levou Araragi a um ponto satisfatório no seu arco de personagem. Karen Bee explorou este desenvolvimento ainda mais a fundo e o cimentou. Já Tsukihi Phoenix utiliza desse desenvolvimento para mostrar como Araragi é após o seu amadurecimento. Estas histórias foram escritas enquanto o anime ainda estava sendo produzido e o segundo volume de Nisemonogatari foi lançado em junho de 2009, um mês antes da exibição do primeiro episódio de Bakemonogatari. Por isto, eu gosto de separar Monogatari entre a fase pré-anime e a fase pós-anime. Não só porque foi o próprio anime que motivou o Nisio Isin a escrever outros contos da série, mas também por que a separação destes momentos define a raiz de Monogatari. Há aqueles que acham que a Final Season que verdadeiramente conclui o arco narrativo de Koyomi Araragi e encerra sua adolescência. No entanto, analisando cuidadosamente, Nisemonogatari o fez muito antes, especialmente no seu segundo volume com o conto denominado Final Chapter: Tsukihi Phoenix.

A natureza finalística do título define o arco narrativo do próprio personagem, nesta história, Araragi exerce a sua maturidade e é visto na condição de um adulto. E esta é a maior diferença, e talvez critica, em relação ao que se tornou a série Monogatari depois. Devo deixar bem claro, que de forma alguma a série se tornou ruim, na verdade, é bem pelo contrário. Muitos dos arcos preferidos dos espectadores e leitores são contos da Second Season ou da Final Season, alguns dos meus preferidos inclusive. Em especial porque estas duas temporadas são interligadas e se aproveitam muito bem da primeira para fazer um build-up que irá levar a um momento mais catártico do amadurecimento do Araragi. Porém, é factual que tanto a Second Season quanto a Final Season repetem o arco de personagem pelo qual Araragi já havia passado na First Season e que a consistência temática e narrativa da história não é tão bem amarrada quanto a de sua concepção inicial. É claro, isto não é nada tão relevante assim, afinal Nisio Isin consegue mascarar muito bem a repetição deste arco, transitando entre a perspectiva do Araragi e de outros personagens na Second Season e desconstruindo o personagem, para depois resolvê-lo, aprofundá-lo e desvendar seus mistérios na Final Season. Existe muito do que se aproveitar e se aprofundar nas outras duas temporadas, mas ainda assim, eu não diria que elas são tão densas quanto a primeira. As resoluções de personagens e as camadas temáticas estiveram presentes desde o princípio e atingem o seu ápice em Nisemonogatari. Razão pela qual eu não consigo entender como tanta gente ainda não entende a obra e a enxerga como o ponto mais baixo de Monogatari.

Depois deste último texto, não haverá mais necessidade de que eu faça uma análise temática de outros contos ou temporadas de Monogatari. Talvez eu retorne no futuro para algum tema específico, mas tratarei com finalidade a conclusão da história como ela foi concebida e isto por si só, servirá para quem refletir sobre o tratado utilizar desta compreensão para olhar para os arcos futuros. Eu acompanho Monogatari até hoje, pretendo continuar acompanhando no futuro. É algo com o qual eu cresci desde o final de minha adolescência e é uma das minhas obras preferidas. Porém, é com tristeza e alegria que eu digo que neste conto, Monogatari acaba para mim.

O sexo como metáfora para intimidade

 

Isto é algo do qual eu já falei nos outros textos, mas engana-se quem acha que a sexualidade explícita é a finalidade do discurso de Monogatari. Ela demonstra parte do contexto adolescente, certamente, mas é algo que varia de caso a caso e isto deveria ficar especialmente claro em Tsukihi Phoenix. Apesar disto, muita gente que assiste ou lê Nisemonogatari não consegue entender a finalidade do “fanservice” e afasta-se de Monogatari ou desgosta deste período em virtude disto. Não que tenha problema algum em não gostar, cada um deve respeitar os seus próprios limites pessoais. O errado é achar que não existe significado quando não se está predisposto a fazer um esforço para entender a mensagem.

Em Tsukihi Phoenix, a sexualidade é utilizada como uma metáfora para intimidade. É óbvio que o próprio sexo já serve como uma demonstração de intimidade, mas aqui, ele se encaixa como uma figura de linguagem simbólica para a distância entre as pessoas num sentido mais complexo e, ironicamente, não sexual. Então, você, querido leitor, me pergunta: Se o sexo é uma metáfora para intimidade num sentido não sexual, então por que diabos ele está lá?

Por que é a forma que o Nisio Isin gosta de trabalhar suas narrativas, não gratuitamente, não por fetichismo – talvez um pouco, quem sabe? –. O autor gosta de trabalhar os seus mistérios e suas narrativas não só para que eles sejam complexos e intricados, mas também para que sejam muito mais engajados com o entretenimento da audiência. Não só pelo apelo “estético” ou “descritivo”, afinal, isto é importante como um bait para atrair alguns leitores ou espectadores inicialmente, mas principalmente por causa da comunicação. Existem mensagens e experiências que são mais facilmente transpostas dentro de uma narrativa quando o leitor interage com elas diretamente e é exatamente este tipo de metanarrativa que Nisio Isin gosta de desenvolver em Monogatari, tornando-o um trabalho de perspectiva em múltiplas camadas (autor, narrador, personagens, leitor). E utilizar a sexualidade é um dos jeitos mais fáceis de atrair o interesse, a atenção e identificação dos leitores e fazê-los sentir-se parte da história, tornando-se a ferramenta perfeita para trabalhar os dilemas dos personagens sem necessariamente ter que trazê-los à tona de maneira expositiva e fora da disposição da psique de cada um deles.

Em Nisemonogatari, fala-se muito sobre a distância que surgiu entre os irmãos Araragi. Karen e Tsukihi sentiam falta do irmão, Koyomi, e não conseguiam mais interagir com ele normalmente. As garotas guardavam consigo a ideia de que ele estava crescendo muito mais rápido que elas e sentiam medo disto. Em Karen Bee, nós vimos que isto ocorreu não só devido às transformações pelas quais Araragi passou, mas também por causa de sua auto-rejeição. Porém, na conclusão do arco, Koyomi chegou em um consenso com Karen e consigo mesmo, se aproximando de sua família novamente e sentindo orgulho disto. Baseando-se nisto, no começo de Tsukihi Phoenix, Karen se sente à vontade o suficiente para pedir um favor para Koyomi e é aí que começa o jogo de contradições.

No diálogo interno de Koyomi, ele age como se houvesse uma certa indiferença ou indisposição entre ele e as irmãs, ele age de forma distante. Porém, existem momentos onde seu diálogo é suavizado para expressar os seus verdadeiros sentimentos. Em nenhum instante qualquer dos sentimentos é definido como verdade num primeiro plano, mas isto não tem tanto peso neste momento por causa do tom cômico da cena. E é neste contexto que surge a famosa “cena da escova de dentes”. Nisio Isin extrapola como só ele sabe fazer e coloca todos sob o constrangimento e a sutileza do ato inimaginável. Ele desenvolve muito bem como o contato íntimo é inesperado, porém bem-vindo entre Koyomi e Karen e é justamente nesta hora que todas as fachadas e desculpas deles são esquecidas em prol de sua relação. Não importa os conflitos que eles tiveram ou o que os personagens digam, o que a cena nos mostra é que Koyomi e Karen são sim muito próximos. Para mal ou para bem, é uma cena envolvente e que também coloca o leitor nesta posição surpreendente e num conflito de sentimentos entre a prudência e a curiosidade imoral.

O pior, no entanto, não acontece, pois Karen e Araragi são interrompidos por Tsukihi, lembrando-nos que existe mais uma pessoa que faz parte desta dinâmica. A bem da verdade, embora Karen e Tsukihi se auto-intitulem as irmãs de fogo, ser uma defensora da justiça sempre foi algo que coube muito mais a Karen (e ao Araragi) do que a Tsukihi. Ela é auto-consciente disto e isto a incomoda, pois ela sente que desde o confronto com Koyomi, Karen tem se tornado muito mais independente. A saudade e o medo que elas sentiam de ver o irmão crescer e se distanciar é algo que Tsukihi agora sente em relação a Karen. A caçula carrega consigo esse complexo de inferioridade e um medo da rejeição, por que é justamente ela que não vive de convicções como todos os outros e ver Karen e Araragi se aproximarem apenas joga lenha na fogueira de sua insegurança.

Os sentimentos de Tsukihi são extremamente importantes dada a sua natureza. Ela é o cuco inferior, uma aberração imortal que toma posse de uma mãe e se torna a cria dela. Ou seja, essencialmente, Tsukihi parece humana, mas não é, parece alguém da família Araragi, mas não é. Ela é uma “impostora”. Especialmente em contraste com a Karen. Aqui, o debate deixa de ser ideológico e se torna prático. Sua natureza que apenas imita os humanos para sobreviver, aparentemente não pode determinar a sua existência exercendo a sua própria vontade. Isto gera um contraste simbólico entre o poder de Tsukihi de se regenerar e as cicatrizes que desaparecem e a sua incapacidade de se dedicar a algo com real convicção e como ela se deixar levar por Karen e Araragi que tem uma determinação mais forte. A verdade triste e pragmática seria a de que Tsukihi é apenas um monstro que nunca foi parte da família Araragi. Não que ela saiba disto conscientemente, mas é algo que ela já sente em seu âmago.

E é aí que entra o sexo. Enquanto as inseguranças de Tsukihi são razoáveis e profundas, elas não são centralizadas na narrativa pois Koyomi não permite que elas se fundamentem. Ele aconselha Tsukihi a conversar com Karen e a se abrir com ela e a assegura de que as coisas vão ficar bem. E num ato extremamente questionável, ele a protege, dando a ela um tipo de tratamento que é igual ao que ele dá a Karen… Tirando seu quimono, prendendo seus pulsos, olhando seu corpo nu e apalpando seus seios numa brincadeira de mau gosto – que claramente é assédio sexual –. Tudo para verificar que havia algo de errado pois as cicatrizes de Tsukihi haviam sumido, e nesta situação absurda, a urgência e gravidade das duvidas da garota se perde também. Acentuando que todo o ponto da ação do Araragi não era em prol de um estímulo sexual, mas sim para dar segurança para Tsukihi.

Você já percebeu o contraste? Talvez a gente devesse culpar a mídia otaku por ter nos dessensibilizado para este tipo de conteúdo, mas note como é muito mais fácil questionar a natureza da família Araragi por causa da perspectiva de uma aberração e pela essência de Tsukihi do que pela relação absurdamente imprópria que é retratada pelos irmãos simplesmente por causa da diferença de tonalidade. Nisio Isin subverte a noção do leitor de intimidade através destes conflitos, utilizando da ferramenta da sexualidade para outros significados além do próprio. Eis que a verdade se firma e se molda, quando Koyomi acaba com qualquer uma de suas dúvidas sobre sua relação com Tsukihi ao beijá-la na boca e constatar duas coisas:

1º – Ele não sentiu nada. Então Koyomi entende que vê Tsukihi como uma irmã mesmo e todos os seus medos gerados pelas revelações de Kagenui são dissipados imediatamente.
2º – Tsukihi agiu igualzinho a Karen agiu quando Koyomi teve que beijá-la em Karen Bee para tomar para si metade da febre da abelha. Ela não o fez por imitação, ela não estava presente quando isto aconteceu e as coisas que ela testemunhou no início deste arco deveriam fazê-la chegar a outra conclusão.

Assim, Nisio Isin consegue estabelecer claramente que a sexualidade não é a finalidade do discurso e que o leitor deve se atentar às contradições, pois esta história não é contada de forma imparcial. Ao mesmo tempo, ele utiliza a ferramenta para trabalhar todos estes dilemas internos e de comunicação e exibir os conflitos entre os personagens. E de quebra, ele faz uso disto para deixar claro que Tsukihi é sim sua própria pessoa, que ela formou sua própria personalidade e que ela é parte da família Araragi sim, tal qual Karen. A verdade prática e factual se desmantela como uma mentira aos olhos de Koyomi, que toma o fardo e a responsabilidade de lutar pelas suas próprias convicções.

 

A justiça pessoal

 

Existe algo diferente sobre Araragi em Nisemonogatari, mas especialmente em Tsukihi Phoenix. Nós vemos que ele não tenta se enganar ou fugir de seus problemas e é perfeitamente capaz de admitir os seus próprios defeitos e dificuldades. Considerando tudo pelo qual ele passou até aqui e seu estado mental inicial, é um desenvolvimento e tanto. Koyomi se compara com Senjougahara e Hanekawa, as duas pessoas que ele sente que mais cresceram ao longo dos últimos meses e chega a conclusão de que ele ainda não chegou a fase adulta, ao contrário delas. Para tal, ele reconhece que a última barreira que ele precisa cruzar para alcançar este patamar é superar seu complexo com Shinobu – e sua própria auto-estima, lembra? –.

Talvez o passo mais difícil dar às vezes seja justamente aquele que irá te levar para fora da zona de conforto. Por isto, Koyomi até entende qual o seu problema e tem uma ideia do que precisa fazer para superá-lo, mas no momento, prefere não ter que lidar com isto. A sua relação com Hachikuji se espelha no seu crescimento e amadurecimento e se estabelece como exemplificação deste refúgio. A garota, que na verdade é muito sábia, está posicionada no papel de mentora que antes era ocupado também por Oshino. Ela guia e aconselha o Araragi a tomar as escolhas certas para o seu crescimento. Só que ao mesmo tempo em que ela o incentiva a chegar a este ponto, quanto mais perto ele se encontra de estar psicologicamente saudável, mais próxima é a despedida dos dois. Hachikuji não terá motivos para permanecer neste plano se Koyomi estiver pleno e ela sabe que ele está muito próximo de superar a adolescência. Em um consenso silencioso, ambos tentam adiar esta despedida, adiar a fase de mudanças.

Em contrapartida a Koyomi, pode-se dizer que o seu próprio dilema é de Shinobu também. A vampira ainda não sabe lidar com a sua mudança de perspectiva. Viveu 500 anos sob a sua natureza como aberração, mas agora, “domesticada”, existe uma convergência muito maior dos sentimentos do mundo externo para com ela. A vida de Koyomi começa a afetar e moldar sua percepção aos poucos e isto é o oposto do que Shinobu queria inicialmente, porque afinal, é a vida de humano de Koyomi que está tendo influência sobre Shinobu. Enquanto para Koyomi, é a “vida” sobrenatural de Shinobu que está tendo influência sobre ele.

O interessante é que no fim, todos estes dilemas e conflitos causados pela rejeição e pelo ódio que os dois deveriam sentir um pelo outro são quebrados junto com a insegurança de Tsukihi, estabelecendo-os como superficiais em função de uma visão maior do contexto. Para toda a rejeição que Shinobu demonstra do mundo humano, quando Koyomi chega a conclusão de que Tsukihi é sua irmã e de que ele tem a convicção para proteger isto, Shinobu desperta por si só este mesmo interesse. Não só reconhecendo a própria Tsukihi como um ser humano e não uma aberração, mas também aceitando sua ligação com o mundo humano. Enquanto Koyomi, em contrapartida, não poderia dar a mínima para o que Tsukihi é, ele irá protegê-la por que ela é sua irmã. E na catarse desta revelação, Koyomi supera o seu complexo e aceita o lado monstruoso de si mesmo, aceitando por completo o amor e a relação que ele tem com Shinobu.

E daí vêm novamente, a subversão da ferramenta narrativa. Se a prática era uma metáfora para a intimidade antes, agora a intimidade se revela metáfora para a prática. A relevância do ato sexual se encontra oculta em uma brincadeira com a profundidade da comunicação através da narrativa feita por Nisio Isin quando pela primeira vez, não é só Shinobu quem suga o sangue de Araragi, Araragi também suga o sangue de Shinobu. Enquanto narrativamente o ato tem a função de restaurar a natureza vampírica de ambos e torná-los mais fortes para combater Kagenui e Ononoki, o sentido real é aquele que já havia sido estabelecido como uma possível metáfora em Kizumonogatari: O ato de chupar o sangue, o ato de criar um servo, este tipo de carícia e suprimento é análogo ao ato de sexo. Koyomi e Shinobu atingem a real intimidade quando eles passam a se dedicar um ao outro de forma não platônica. Eles se tornam equivalentes (não à toa, Shinobu cresce para uma forma na qual ela tem a mesma idade de Koyomi, uma outra forma de representar o crescimento deles simbolicamente).

Em Karen Bee, Koyomi teve que confrontar a natureza de sua própria humanidade e personalidade e em paralelo direto, sua relação com Senjougahara se tornou mais próxima. Em Tsukihi Phoenix, Koyomi teve que confrontar a natureza das aberrações e em paralelo direto, sua relação com Shinobu se tornou mais próxima. Eles são equivalentes, o lado humano e o lado monstruoso de Koyomi, e as heroínas representam cada um dos lados da moeda, o amor ao próximo e o amor próprio respectivamente. Ao chegar neste ponto em Tsukihi Phoenix, essencialmente, Koyomi Araragi foi finalmente capaz de aceitar a si mesmo de forma natural e plena e superar a adolescência.

Um contraste interessante é a maneira como a percepção de Koyomi em relação as autoridades especialistas muda ao longo do conto, indo da cautela e do medo até a compreensão e a empatia.

Em Karen Bee, a última impressão de Koyomi em relação a Kaiki foi a de que eles provavelmente iriam se matar caso se encontrassem novamente. Tamanha a sua rejeição pelo golpista. Pois bem, eis que Kaiki e Araragi acabam se encontrando no contexto mais tonalmente inadequado possível, durante o encontro de Araragi e Shinobu no Mister Donuts. É bem difícil levar Araragi a sério quando ele diz que Kaiki parece agourento mesmo neste contexto. É tão difícil de imaginar que ficam bem claras as preconcepções de Araragi em relação a Kaiki. Não que suas impressões não sejam justas até certo ponto, mas elas indicam que ele talvez não esteja vendo a pessoa por quem ela realmente é e que no fim das contas, isto gera mais duvidas do que certezas. E exatamente por isto, foi fácil para Kaiki abusar de Araragi, extorquindo-o para passar-lhe informações que no fim, não se mostraram muito relevantes – e das quais Araragi ainda acabou feliz de receber – e ainda revelando-se como “vilão” para ele o tempo todo, deixando bem claro que o trabalho da coincidência é feito através da malícia. Ainda assim, a postura de Araragi demonstra que na verdade o seu pensamento é bem diferente. Ele não só não entra em conflito com Kaiki, como até mesmo tenta enxergar além de sua persona e compreender seus sentimentos. Eventualmente Koyomi falha no final, mas não tanto por não querer ver e aceitar que Kaiki se importa com Senjougahara e talvez vice-versa, mas sim por discordar dele.

Quando Kaiki diz que a Senjougahara atual é uma decadência, ele fala muito mais de uma perspectiva própria de auto-defesa. Na qual ele acha que para Senjougahara seria muito melhor agir com hostilidade e não guardar o peso de seus sentimentos. Assim, ela não estaria vulnerável a se ferir por lidar com os sentimentos dos outros e iria se salvar de possíveis traumas. Araragi não enxerga desta forma. Ele reconhece muito mais valor na segurança de Senjougahara e vê sua reabilitação como uma forma de reverter a toxicidade que a cercava numa armadura muito mais forte proporcionando-a felicidade. Ele enxerga valor na sua conexão com o próximo, algo que é simbolizado por Senjougahara. Por isto ele se sente muito aliviado de vê-la ser capaz de se comunicar e se relacionar com o mundo e às pessoas a sua volta de forma saudável. Vemos tudo isto na despedida entre Kaiki e Koyomi, quando apesar de ter sido extorquido de seu dinheiro e de sua carteira, a única coisa que Araragi não permite que Kaiki guarde para si é a foto de Senjougahara que estava em sua carteira. Acima de qualquer coisa aquele é seu verdadeiro tesouro que deve ser protegido. E como é algo que Kaiki abdicou dada a sua filosofia de vida, ele não tem direito a ele.

Desconsiderando esta questão, no entanto, Koyomi realmente passou a compreender Kaiki melhor no fim. Após descobrir que foi ele quem orquestrou a descoberta de Tsukihi por Kagenui, já planejando extorquir tanto Yozuru pela informação de uma caçada quanto Araragi pela informação de uma possível ameaça, de forma surpreendente, Araragi não vilaniza Kaiki. Ele enxerga que ele não o fez por real malícia, talvez por interesse próprio, mas não por vingança. Araragi entende que a convicção de Kaiki é se colocar nesta posição de vilão, e por fazê-lo, ele já está subjugado à derrota. A justiça em Tsukihi Phoenix já não é tratada por Araragi como um ideal absoluto, mas como uma questão de perspectiva. Ele entende que o que dita a justiça é absoluto, no sentido de que a verdade é definida pelo vencedor.

Por isto, a visão de Araragi de Kagenui é curiosa de ser observada. Inicialmente, apesar de sua cautela, Araragi não enxergou o potencial da ameaça que ela representava. Posteriormente, após a sua catarse psicológica, Araragi enxerga Kagenui e Ononoki como a justiça personificada. Não por realmente acreditar nisto, mas por estar disposto a enfrentá-la de igual para igual, por estar disposto a talvez ser o vilão que será derrotado para defender a sua convicção.

Diante do conflito Araragi define e encontra sua própria justiça. Não através de um ideal, mas através de sua convicção e por finalmente fazê-lo, ele é capaz de entender e respeitar a dos outros. O que realmente importa para Araragi é que agora ele tem algo a proteger. Não por uma necessidade de sanar a toxicidade de sua depressão e de seu ego através de uma deturpada imposição de valor para justificar a sua existência, mas por que é algo que ele realmente valoriza e que o faz se sentir bem por estar vivo.

Em Bakemonogatari, já havia ficado claro que Oshino estava preparando Araragi para que ele pudesse andar em suas próprias pernas. Porém, a questão fica mais evidente quando descobrimos que ele passou os meses que esteve na cidade empurrando todo tipo de informação e conhecimento sobre aberrações e afins em Shinobu para que ela pudesse ajudar Araragi no futuro. E ainda mais evidente quando Kagenui enxerga similaridades em Oshino e Araragi. A jornada de crescimento do Araragi já havia sido elaborada desde o começo para que ele se tornasse livre como uma autoridade. Embora seja relevante que Araragi enxerga sua convicção de forma diferente da de Kagenui, Oshino e Kaiki. Mesmo que ele se assemelhe a eles de vez em quando, a suas respostas são somente suas.

E veja só, é justamente através dessa capacidade de compreensão e empatia que Araragi vence Kagenui. Para começar, ele não estava disposto a realmente ter um embate mortal com ela. Kagenui, como Oshino fez em Kizumonogatari, tratou como um ser humano desde o princípio, apesar de seu vampirismo. Então enxergando esta empatia em Kagenui e consequentemente sentindo empatia por ela, Araragi também nota que ela trata Ononoki como uma irmã, apesar de que esta deveria ser apenas sua familiar. Desta forma, Araragi mostra a Kagenui como é comum e normal um familiar imputar os seus valores noutro e defendê-lo através da hipocrisia e da mentira. Que estes valores podem sim se configurar em uma verdade e bondade, afinal, ela mesma o faz com Ononoki.

Araragi quebra a justiça de Kagenui provando para ela que o praticismo de Xun Kuang pode gerar bondade através da hipocrisia de achar-se o certo, quando no fundo, está apenas enaltecendo o seu próprio ego em contraponto a bondade inata e corruptível da filosofia de Mencius. Kagenui se dá conta disto não só por empatia, mas também por causa da sua convivência com Kaiki. Enxergando também uma similaridade entre Araragi e o golpista através da compreensão desta filosofia. Adequadamente, a resolução de Kagenui é de que ela irá abrir uma exceção para Koyomi e Tsukihi em sua justiça pessoal, pois ela se vê confiando em Koyomi para ser um bom mentor para a irmã.

Reiterando então, a mesma resolução e validação que Koyomi recebe e encontra em Owarimonogatari sempre esteve presente em Nisemonogatari. Não tão fundamentado lá através dos conceitos de justiça, ideal ou verdade, mas no fim, os conceitos são apenas uma exemplificação dos ponto de vistas distintos e de uma noção saudável de relacionamento interpessoal e intrapessoal. Na First Season eles são discutidos através de embates filosóficos, enquanto posteriormente eles serão discutidos através da resolução de mistérios.

E o epílogo, ou melhor, a punchline, é que Koyomi percebe que o que ele enxerga como felicidade hoje é algo que sempre esteve a sua frente. Por isto, ele finalmente se sente confortável o suficiente para compartilhar de sua intimidade de forma genuína com outras pessoas. Na conclusão de Tsukihi Phoenix, Koyomi revela para Tsukihi seu relacionamento com Senjougahara e finalmente decide apresentá-la às suas irmãzinhas. Enfim iniciando um processo de união e harmonia dos diferentes lados de sua vida.

 

 

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