Arco x Arco: Fairy Tail #02 – Ilha Garuna

Como prometido, cá estamos em mais um texto sobre os Arcos de Fairy Tail, dessa vez, sobre o Deliora, arco que vai do capítulo 23 ao 46, compreendendo os volumes 4, 5 e 6. Se quiser ler o texto sobre o Shinigami, clique aqui.

Julgamento da Erza

Voltando de onde paramos no texto anterior, a Erza vai presa, e apesar de isso durar um capítulo, os problemas são impressionantemente muitos. A começar pelo começo, temos um “Natsu lagartixa” preso dentro de um pote, então…ele tem poder de metamorfose? Todos têm poder de metamorfose? É um poder básico dos magos? Por que ele viraria uma lagartixa? Por que ele nunca mais usou esse poder?

A resposta pra todas essas perguntas é: porque convém ao plot. O Natsu ser substituído pelo Macau (personagem, não cidade) serve para o fator de surpresa do capítulo, pra termos um wow na hora da revelação. Só que disso eu tiro duas questões, a primeira é, se trocar os personagens de lugar foi feito para surpreender o leitor, então por que mostrar o Macau antes de mostrar o Natsu quebrando a parede? Não seria mais efetivo se o contrário acontecesse?

E a segunda questão é, se o Mashima está disposto a quebrar a lógica do mangá dele pra uma surpresinha de um capítulo, o quão ele não vai estar disposto a sacrificar para momentos “maiores”? Isso, no mínimo, mina a confiança do leitor no escritor, fica aquela sensação de que o que o roteiro fala não se escreve, porque pode ser mudado ao bel prazer da necessidade.

O segundo grande problema desse capítulo é o MAIOR potencial desperdiçado desse mangá, quiçá da carreira de Hiro Mashima, Siegrain. E pra falar disso, eu vou me ater a só o que temos até agora, já que esse assunto vai voltar uns arcos para frente e eu não quero estragar quem está, por algum motivo, acompanhando Fairy Tail junto com esses textos.

Mas digamos que, Siegrain devia ser o vilão final de Fairy Tail, ao menos ele devia ser um vilão marcante. O personagem é apresentado antes do protagonista, tem destaque político social naquele mundo. Mundo esse que, como o Shinigami destacou, não é dos mais justos. Além disso ele coloca o terror na personagem que, até o presente momento, é destacada como A MAIS PODEROSA. Toda essa construção já é mais do que o Mashima vai conseguir fazer com qualquer outro vilão, fora o último, e ainda nem estamos no arco em que ele age.

Ainda no tópico do Siegrain, ele no final do capítulo descobre que o Natsu é da Fairy Tail…Que??? Você está me dizendo que um membro do conselho, aquele mesmo conselho que coordena as guildas, tem interesse em um mago e não sabe a qual guilda esse mago pertence? Esse mesmo membro do conselho, que no primeiro capítulo está lendo uma reportagem sobre o salamander quebrando um porto pra prender contrabandistas? Ele não sabe que o Natsu é o Salamander? Como esse mundo funciona? As guildas não têm que passar uma lista com os seus membros para o conselho? Tantas dúvidas, tudo por um cliffhanger barato.

Missão Rank S

Eu tenho algumas coisas pra falar sobre esse momento pré arco na verdade eu meio que tenho coisas demais pra falar pra algo que dura 2-3 capítulos. Existe um conceito chamado problema da escalada (que o Super Eyepatch Wolf fez um vídeo sobre e mesmo que eu não concorde com algumas opiniões dele e outras coisas estão objetivamente erradas, a explicação do conceito que eu vou usar é de lá, então fica aí o vídeo).

Enfim, problema da escalada é quando uma história vai aumentando sua escala de ameaças sem controle e tudo acaba perdendo a conexão com o leitor, tal qual a Kaguya em Naruto, ou o que muitos apontam como o problema do arco do Buu em Dragon Ball.

Enfim, toda história grande de ação tende a sofrer com o problema de escalada, de cinema a literatura, até, obviamente, os quadrinhos. E se tem um gênero que sofre com essa ameaça quase que endemicamente, é o b-shonen.

Então, ao colocar como segundo arco uma missão Rank S, o Mashima já se colocou em uma armadilha automaticamente.Como prosseguir daqui? Se o Natsu vencer, ele não vai poder voltar a fazer missãozinha bunda? Se o Natsu perder, só a morte o aguarda. Isso faz com que a idéia de Fairy Tail seja uma história de pessoas na guilda indo em missões seja abortada já no segundo arco, e o que vem a seguir não funciona tão bem estruturalmente com o que veio antes, mas é a única maneira que o autor achou pra seguir com a história.

Fora isso, esses dois ou três capítulos servem para apresentar mais 2 dos 5 magos fodões da guilda, o Crocodile Laxus e o Mistogan. Falando rapidinho sobre eles, o Laxus é o básico cara fodão, mas pau no cú, nada de novo além dele ser realmente muito Crocodile. Já o Mistogan é um personagem misterioso que tem um puta momento de apresentação de personagem, e no futuro a gente vê se ele vale ou não o hype que vende.

Enfim, o Natsu rouba o papel comprovante da missão e vai junto da Lucy e do Happy. Como ele fez algo fora das regras, o Makarov envia o Gray para impedí-lo, que como bom bucha, acaba amarrado e levado junto à força.

Ilha dos Demônios

Bom chegamos de fato ao arco, e tudo começa com os moradores, que estão sofrendo de uma maldição que altera seus corpos. Então eles pedem ao quarteto que destruam a lua, e essa é a premissa básica, encontrar uma maneira de deter a maldição sem ter que explodir a lua.

 

Enquanto conceito, esse arco começo é legal, apresenta a dificuldade que uma missão de classe-s pode alcançar, enquanto requer dos personagens alguma sagacidade para lidar com a situação. O problema é que a resposta aparece quase que imediatamente, e não é lá a coisa mais interessante, bate nesses caras aí que tudo fica bem.

Mas vamos olhar para o que é mais esquisito nesse segundo arco, a relação Gray/Natsu. Peguemos o que nós temos até agora, Gray e Natsu são dois opostos, eles não conseguem se dar bem em nada, no entanto, lá no fundo existe um sentimento de respeito do Gray para com o Natsu, evidenciado por uma ou duas falas no arco anterior. Entretanto, a recíproca não é verdadeira, o Natsu claramente não tem algo além da rivalidade baseada no atrito para com o Gray. E aqui isso é um problema.

Quando o barco afunda e eles vão parar na ilha, o Gray e o Natsu param de agir como rivais totalmente, e estabelece uma relação padrão de personagens que se conhecem, sem motivo aparente. O roteiro tenta vender que eles se tornaram mais próximos, por algum motivo, mas eles parecem mais distantes do que nunca, isso antes de qualquer menção ao Deliora. A cooperação standart Gray/Natsu só funciona com uma figura forte como a Erza servindo de mediadora, por isso aqui, essa nova forma da relação soa forçada para dizer o mínimo.

O cúmulo da estranheza vem quando o Gray chora quando é carregado pelo Natsu, aquela “amizade”, da maneira que foi construída até ali, não merece essa cena emocional, então a tentativa barata de emocionar o leitor caí por terra. O Happy chora páginas antes, e esse choro, também com o Natsu como catalizador de certa maneira, soa muito mais natural, muito mais orgânico.

Ainda falando do grupo principal, a Erza recebe mais umas pinceladas de personalidade, que são interessantes, em como ela se importa apenas com a missão a que lhe é atribuída. Então “as pessoas da ilha estão sofrendo” recebe como resposta “não é problema meu”, algo que eu sinceramente não lembro se é mantido pelo resto do mangá, mas espero que sim.

Ur e Deliora

Eu queria dedicar um tempo maior pra falar da espinha emocional desse arco, isso é, Ur, seus discípulos e os demônios do passado (literalmente). Começando do começo. Eu gosto que o flashback dura apenas 3 capítulos meio entrecortados com o presente. Faz dele mais objetivo e dinâmico do que se esticasse por 4-6, mas claro que esse passado vai ser revisitado no futuro, mais de uma vez, e a simplicidade morrerá no caminho, mas deixemos para o futuro, o que apenas ele reserva.

Acho que um bom ponto de partida pra olhar esse flashback, é através do personagem que nós, em teoria, gostamos. Gray começa essa história sendo o único sobrevivente de uma vila atacada pelo Deliora e jura vingança, então ele treina com sua mestra, se mostra teimoso e acaba causando o sacrifício da mesma para a criatura. É um passado interessante, mas o que ele realmente diz sobre o personagem que temos hoje?

A personalidade atual do Gray de ser “too cool for school” não parece advinda da perda da própria mestra. Ele não demonstra ser fechado ou distante com seus companheiros de guilda com medo de se machucar, nem segue as regras colocadas pelos mais velhos e sábios, com medo de fazer besteira. Em suma, esse é um flashback que nos conta o passado de um dos protagonistas da história, sem falar uma vírgula sobre o personagem em si.

Só isso, já torna essa parte da história muito fraca, aliado a isso, nós temos a explicação da piada do Gray. Explicar a piada de um personagem é uma faca de dois gumes, se feito de maneira satisfatória, enriquece aquele ser, mas se feito como aqui, é só uma informação descartável, que poderia ter sido colocada em um databook.

Então, assumindo a máxima de que as coisas colocadas em uma obra devem servir a alguma função, se esse flashback não é do Gray, ele é do Leon. Certo, o que temos do Leon até aqui é que ele deseja derrotar a mestra dele e culpa o Gray pela morte dela…exatamente o que já sabíamos antes disso tudo. Falar do Leon é difícil, ele devia ser um personagem trágico, que perdeu aquilo que mais amava ainda pequeno e não sabe lidar com a morte. Junto com essa perda, o irmão adotivo (pelo menos a própria narrativa vende que eles são como se fossem filhos da Ur) vai embora e o deixa pra trás. Mas é tudo escrito de uma forma tão caricata que eu simplesmente não consigo levar a sério, e só espero o momento em que ele dará uma risada maligna de filmes da Disney.

Bom, por exclusão então, esse flashback só pode ser da Ur, uma personagem que acolhe esses órfãos e os treina nas artes mágicas. Mas o problema é que ela é uma personagem muito distante e idealizada pelo texto pra ser um personagem central daquela parte da história. Ela, que já está em idade de casar e devia se livrar das crianças porque senão nunca vai arrumar um homem (Mashima, esse grande escritor contemporâneo), e o único outro traço dela é de que ama muito os discípulos. Ela está tão de escanteio, que se o flashback for focado nela, foi uma falha e tanto.

Só fiz essa volta toda pra dizer que, por mais que eu goste da velocidade com que esse flashback acontece, seria melhor ainda se ele nem existisse, já que ele é completamente inútil narrativamente.

Ice Shell

Bom, a partir daí, acontecem duas lutas, a criativa e muito bem coreografada entre Gray e Leon, que pega coisinhas que foram sendo jogadas durante o arco, como a soberba do Leon, para ter uma conclusão satisfatória…e a do Natsu, que não tem qualquer significado no momento e é uma promessa de coisas que virão.

É bom salientar que o Leon nesse ponto já cruzou a linha da obsessão para ser um verdadeiro psicopata a muito tempo, mandar fazerem um genocídio na vila não devia ser redimível com um foi mal, eu tava doidão, mas é o que rola no final do arco.

Enfim, Deliora é liberado, mas ele já está morto, voltam pra vila, em um twist legalzinho sobre os habitantes, fim do arco.

Mas aí, temos a revelação do arco, que o personagem que enfrentou o Natsu, na verdade tá mancomunada com o Siegrain, que se revela como um dos 10 magos santos, e é a filha da Ultear. Além disso, o plano ainda envolve o protagonista, o que dá ainda mais um gosto de vilão final pro Siegrain, pena que nunca o será.

Com isso, nossos heróis voltam pra guilda, a Lucy consegue (mais) uma chave do zodíaco, e eles se encontram com a talvez melhor transição de arco desse mangá, que é uma imagem da guilda totalmente destruída. E é com essa imagem, que eu termino esse texto, até a semana que vem.

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