Gundam Narrative é um eco de uma timeline cansada – Crítica

Mobile Suit Gundam Narrative é um filme da franquia Gundam, lançado nos cinemas japoneses em Novembro de 2018. A direção do filme ficou por conta do Shunichi Yoshizawa (estreante) com roteiro do Harutoshi Fukui (Harlock: Space Pirate, Mobile Suit Gundam Unicorn light novel). O filme é uma produção Sunrise (Code Geass, Cross Ange).

Um ano após os eventos de Gundam Unicorn, nada mudou. O unicórnio branco e o leão negro foram escondidos do conhecimento público, mas tudo muda quando a fênix dourada retorna.

Isso foi para o cinema?

Gundam Narrative é pobre visualmente. Talvez essa seja a melhor coisa para se começar. Desde seus char designs claramente simplificados com relação ao Unicorn. Até seus planos, em sua maioria, bem pouco inspirados.

É quase como se fosse um filme desenvolvido desde a base no piloto automático. Um filme feito pra cumprir tabela. Pouco interessado com a própria história.

Os personagens parecem genéricos, designs rejeitados de produções anteriores. Designs que acabaram conseguindo espaço nesse eco de uma timeline cansada.

Veja, eu gosto do Universal Century, nem por isso posso fechar os olhos pro fato de que ele já devia ter acabado. A timeline tem pelo menos 2 encerramentos, um em Char’s Counterattack, outro no próprio Unicorn. Ainda assim a franquia se recusa a abrir mão de sua linha principal, mesmo que já não tenha uma história a ser contada.

Quero dizer, toda questão do final do Unicorn é sobre confiar nas escolhas e na possibilidade de um futuro melhor. Daí chegamos no Narrative e é a exata mesma coisa de sempre. Além de não entregar uma narrativa interessante, ainda por cima acaba por diminuir o impacto narrativo da série anterior. 

Falando em série anterior, Narrative parece muito uma gigantesca punheta pro fandom. Um filme com uma hora e meia de reciclagem de séries anteriores não vai fazer dele bom, principalmente pela execução que é, no mínimo, capenga.

Triângulo…amoroso??

Então vamos entrar um pouco mais nos personagens. Gundam Narrative tem…4 personagens mais centrais. O trio formado pelo piloto Jona Basta, a verdadeira agora é pra valer newtype Rita Bernal e a comandante Michele Luio. Fora a trinca, temos o antagonista Coringa do Jared Letto Zoltan Akkanen.

O trio cresceu junto na Austrália, até que uma visão do futuro feita pela Rita preveniu que eles estivessem presentes na derrubada da colônia da série de 79. A partir daí, foram levados para um centro de pesquisas da Titans a fim de serem transformados em cyber-newtypes. Circunstâncias fazem com que o trio se separe.

Tudo isso é muito interessante, no papel. O problema é que o filme se importa muito pouco com a construção dos personagens. Somos então reféns a breves flashbacks mostrando pedaços da infância dos três. Isso acaba por minar completamente a relação do espectador com a relação dos mesmos. Da forma como é feita, toda picotada, parece um resumo de uma série que nunca existiu.

Não ajuda muito o quão genérico o Jona é. Em certo ponto da história, alguém o questiona do motivo dele estar nessa missão. “Se formou na academia de pilotos sem méritos ou deméritos, um piloto medíocre”. A questão da mediocridade do Jona é reforçada em outros dois ou três momentos, mas o roteiro nunca faz nada com isso. É apenas um ruído de personalidade que é completamente esquecido no terceiro ato, quando o personagem vira superfodão.

Piloto medíocre vs experimento falho

Seu antagonista é igualmente tosco, Zoltan parece vindo diretamente de Gundam Wing. Um personagem completamente edgylord com um background de ser uma nova tentativa de Full Frontal. A personalidade dele se resume a ser psicopata. Objetivos? Vencer o Gundam. Porque? Nunca fica realmente claro. Mas isso não impede o personagem fazer monólogos vazios para si mesmo sobre Zion, ou a guerra, ou ser um rejeito.

Não ajuda o fato do roteiro nunca conseguir fazer a ligação entre o Zoltan e o Jona. Eles não são faces da mesma moeda, nem contraste de uma mesma ideia. A história simplesmente precisava de um vilão, e nada melhor que um personagem edgy.

Mas Gundam Narrative me enganou por uns instantes. Parecia que existia uma temática ali, sobre o Gundam do protagonista ser uma cópia barata do Unicorn, enquanto o vilão em si tentava mimicar uma persona distorcida do Char. Ao final do filme, percebi que não era uma temática, mas o roteiro tentando pescar os fanboys através de referências.

Uma coisa muito curiosa em Gundam Narrative é ele misturar vários conflitos em um filme de uma hora e meia. Temos o conflito envolvendo o mecha misterioso que é uma tecnologia banida. O conflito envolvendo o robô fodão clone do final de Unicorn. A busca da Michele pela Rita. Uma corrida contra o tempo para pegarem o Phenex.

Só que como esses conflitos não se complementam, eles acabam criando uma nuvem de interferência e tirando o peso uns dos outros. Ao ponto que, quando a Michele se sacrifica pelo Jona, não senti tristeza, nem felicidade, não senti nada, e isso é o pior resultado que um sacrifício “emocional” pode causar no espectador.

A grande temática do Narrative

Narrative tem um tema que fica ecoando por todo o filme: a existência de almas e um pós morte. É um tanto bizarro isso ser a discussão de um Gundam mainline…quando basicamente todas as séries têm um momento do personagem morto aparecendo para terceiros. Mas enfim, esse é o tema.

Não que ele faça muito com o tema de qualquer maneira, a Michele quer pegar o robô mágico para salvar o pai da morte. Até que ela não quer mais, daí ela morre. A frase que “a vida é para os vivos” meio que paira pelos três atos, uma versão mais pobre das discussões de Unicorn.

Mas toda essa questão sobre o Phenex geram uma série de problemas. O primeiro disso é que a série principal está entrando num abismo muito complicado ao criar um mecha capaz de viajar no tempo. 

Digo, todo o terceiro ato desse filme tem um vilão que consegue fazer um mecha arrastar colônias inteiras com o poder da mente. Isso talvez coubesse em Gurren Lagann ou Getter Robo, mas numa série mais “hard sci-fi” como Gundam só te tira da experiência. 

Em dado momento o risco é que uma explosão gigantesca jogue os destroços de três colônias contra a Terra. Afinal se é maior a audiência vai se preocupar mais.

O outro é que o final de Char’s Counterattack era pra ser um momento de catarse, a façanha realizada pelo Amuro no final daquele filme precisam ser incrivelmente absurdas. Só que depois desse filme, parece que foi só uma terça-feira qualquer.

Ajoelhai perante o Deus Gundam

Chamar Gundam Narrative é, no mínimo, irônico.

Terminei Gundam Narrative com um sentimento de desgosto. É um filme feio, pouco inspirado e mal montado. 

Se a ideia é que ele represente o ideal do futuro do Universal Century, devo dizer que o Full Frontal estava certo, e a Laplace Box nunca deveria ter sido aberta.

 

Deixe uma resposta

2 pensamentos em “Gundam Narrative é um eco de uma timeline cansada – Crítica”