Vai Nagai! 01 – Gakuen Taikutsu Otoko

Gakuen Taikutsu Otoko é um mangá de 3 volumes lançado em 1970. Escrito e ilustrado por Go Nagai, como de praxe nessa coluna, é o mangá que abre a Vai Nagai! mas a que preço?

Antes de continuarmos, importante aviso de gatilho para violência gráfica e abuso sexual, não recomendado para pessoas sensíveis ou menores de idade.

Sinopse: Mondo Saotome faz parte da guerrilha estudantil, um grupo de estudantes armados que quer combater o opressivo sistema japonês. Saotome é o líder sanguinário de uma das facções, e busca a guerra mais pelo prazer da batalha, que por qualquer ideal nobre. Essa é a história do embate entre professores e alunos num banho de sangue sem fim em busca de poder institucional.

A leitura de Gakuen Taikutsu Otoko (GTO) foi bastante curiosa. Por ser um trabalho um tanto menor do Nagai, entrei sabendo basicamente nada e me deparei com uma grande narração sobre o estado da educação japonesa. Para contexto, o Japão teve uma série de revoltas e protestos estudantis durante os anos 60, reivindicando entre outras coisas a retirada das tropas americanas do solo japonês. Pra quem quiser mais detalhes, fica o link aqui.

Uma apresentação de protagonista como poucas

O Nagai então pegou esse contexto e extrapolou para o futuro distópico de 1972, onde o Japão virou um grande faroeste nos embates entre colégios tirânicos e adolescentes anárquicos. Não espere que o Gakuen Taikutsu Otoko vá ser um grande tratado sobre o tema, mas o roteiro tem sim sua dose de pinceladas ácidas sobre o assunto. Sempre banhado pelo tom do exagero e da bizarrice com toques de pessimismo.

Por exemplo temos o já citado Mondo, que é o cabeça da guerrilha estudantil, e um completo psicopata. De forma semelhante, existe nenhum interesse por parte dos professores em ensinar, ou criar um ambiente propício para tal, existe apenas o desejo por exercer o poder. E mesmo ao final da obra, ele ainda traz uma outra alfinetada envolvendo qual a maior arma do colégio invencível, que aborda um pouco sobre pessoas dispostas a comprar a narrativa do status quo, mesmo que aquilo não seja benéfico pras mesmas. Mas a verdade é que esses comentários sociais são apenas isso, breves comentários, e não são o que a história tem de melhor a oferecer.

Acontece que o roteiro também é muito pouco aproveitado. É bastante claro que o Nagai não tinha muito uma ideia para o grande arco do mangá, com cada volume terminando bastante distinto um do outro. O primeiro volume é um grande arco de cerco, que serve de base para estabelecer as diferenças filosóficas dos eternos rivais, Mondo e Tatsuma. Já o segundo tem uma guinada gigantesca e se torna por vezes uma história de terror, com uma mansão cheia de monstros disformes e um foco bastante grande na construção do clima soturno. E o terceiro é uma grande culminação de twists e revelações mal trabalhadas, que surpreendem o leitor, mas deixam um gosto amargo logo depois. Mas vamos por partes.

Saotome Mondo não poupa ninguém

Antes de mais nada, gostaria de apontar que o trabalho visual que o Nagai está fazendo aqui é realmente incrível. O quadrinho não poupa esforços para mostrar todo o tipo de cena gore. Gakuen Taikutsu Otoko quer muito que você tenha certeza da brutalidade do campo de batalha e ele faz isso de maneira majestosa. De forma análoga, existe um monstro dito como invencível na história, e o Nagai consegue passar de forma sublime através de roteiro e arte a tensão toda vez que ele está em tela. Nesse sentido, ele consegue puxar muito bem entre o primeiro e o segundo volume. O primeiro é uma longa construção sobre como o Mondo é imparável e invencível, dilacerando e usando tudo no seu caminho para poder vencer. Então quando o monstro consegue colocar um pavor e até empatar com o protagonista, o leitor compra muito fácil o perigo do mesmo.

Mas não é só nas cenas de ação que Gakuen Taikutsu Otoko brilha. Por mais que a mudança de tom entre os volumes seja brusca, o Nagai já demonstra aqui nesse início de carreira um controle muito grande de narrativa. Toda vez que nos encontramos na mansão dos monstros, o autor toma um cuidado redobrado de desacelerar a narrativa, e construir a tensão com uma série de quadros mudos mostrando os cantos do ambiente, insinuando sombras e formas. Ao mesmo tempo, ele permite momentos intimistas dos personagens dentro da mansão, o que ajuda a construir o clima do grande monstro que mora lá. Falando em momentos de personagem, as caras de completa psicopatia estão excelentes nesse mangá.

A Mansão dos Monstros onde o mal espreita

Infelizmente o roteiro não consegue acompanhar tão bem. Na metade final do volume 2 nos é revelado quem o monstro enfaixado de fato é, e essa revelação é surpreendente, nos faz reinterpretar uma série de questões do que tinhamos visto até ali. Só que o mangá imediatamente joga isso fora no começo do terceiro volume, numa clara demonstração que o Nagai não sabia como concluir.

Daí em diante Gakuen Taikutsu Otoko nos senta numa cadeira e basicamente explica por dialogo expositivo todo o seu plot. Os twists em si já são completamente bizarros, mas é ainda mais estranho que nada daquilo estava sequer minimamente setado antes. Mesmo que a gente tivesse uns monstrengos aqui e ali, ainda é completamente sem noção você saltar de um faroeste direto pra um plot de clonagem e uma novela mexicana que não tem nenhuma conexão sequer com o Mondo, o protagonista. E se não bastasse, a história ainda termina num final meio aberto, que dá a entender que todos os personagens foram lutar uma luta até a morte, ou talvez não. As questões da rivalidade do Mondo com o Tatsuma nunca são trazidas de volta, e mesmo as revelações sobre o Tatsuma parecem bem fora do personagem apresentado no volume 1. Realmente uma pena que a história decaia tanto do seu começo até sua conclusão.

Nunca tivemos a conclusão do embate entre os eternos rivais

E é meio que isso que eu tiro de Gakuen Taikutsu Otoko, um mangá que tem pelo menos uns três mangás melhores dentro dele, mas que ao estarem todos retalhados criam um todo fraco. Vale conferir especialmente pela arte que é realmente muito acima da média, mas o roteiro deixa a desejar.

E como já é de praxe no Vai Nagai! está na hora de dizer qual o próximo mangá que aparecerá nessa coluna no mês de Julho. E o mangá é o Demon Lord Dante de 1971, compilado em 2 volumes. Leiam para o mês que vem!

Apesar de tudo, uma bela cidade

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