Muito se discute internet afora sobre a categorização de coisas. E não seria diferente no fandom de animes e mangás. Então, com o advento da internet, uma confusão começou a surgir, afinal shonen é um gênero? A resposta curta é “não”, e a longa é “não, não é”.
O passado
Shonen, tal qual josei, shoujo e seinen, são demografias, ou seja, são subdivisões baseadas em um público alvo. Essas subdivisões existem por que existiam no passado, em um mundo menos globalizado em que fazia sentido separar “coisas para meninos” e “coisas para meninas”.
E mesmo naquela época, essas subdivisões eram feitas para que as propagandas fossem mais assertivas. Esse era o pensamento por trás:
“Essa revista tem como foco meninos de idade entre 12 e 18 anos, vamos fazer propaganda de (insira algo que apela para esse público aqui).”
Ou seja, as demografias tinham muito pouco a dizer sobre o que realmente continha a revista (afinal, o primeiro mahou shoujo foi publicado em uma revista shonen), e mais com os anunciantes da mesma. Isso tanto é verdade, que hoje em dia, mangás como Haikyuu (o segundo pilar da WSJ) tem um público feminino maior que um masculino. E mesmo One Piece beira o meio a meio.
O presente
Hoje em dia, é muito fácil encontrar pessoas na internet dizendo “esse anime/mangá é um shonen”, mas pra isso precisamos fazer a pergunta: Afinal, o que é um shonen?
A definição dos dito cujos para isso provavelmente será algo nas linhas de:
- É tipo Dragonball;
- É aquelas histórias que tem lutinha;
- É aqueles animes com trocentos episódios;
- É aqueles animes que envolvem o poder da amizade;
- Alguma mescla/variação das citadas.
Certo. Seguindo essas 5 definições é possível concluir que: Soul Eater não é shonen; Mangás cancelados da Jump não são shonen; Devilman não é shonen; Qualquer mangá de esporte não é shonen; Qualquer mangá de romance não é shonen; Qualquer mangá focado em ecchi não é shonen; Jojo’s Bizarre Adventure parte 1 e 2 não são shonen.
Ou seja, no melhor dos casos, essa definição é problemática, uma vez que Soul Eater, Devilman e Jojo são claramente o que as pessoas contam como shonen. E a coisa fica ainda pior se você olhar pra Weekly Shonen Jump (quase) atual:
- One Piece,
- Dr. Stone,
- Kimetsu no Yaiba,
- Saiki Kusuo no Sainan,
- Yakusoku no Neverland,
- Bokutachi wa Benkyou ga Dekinai,
- Black Clover,
- Boku no Hero Academia,
- Shokugeki no Soma,
- Bozebeats,
- Hinomaru Zumo,
- Act-age,
- Hunter x Hunter,
- Gintama,
- Spring Weapon Number One,
- Yuragi-sou no Yuuna-san,
- Robot x Laserbeam,
- Golem Hearts,
- Full Drive,
- Haikyuu!!
Utilizando apenas a primeira definição do que seria um shonen, esse é o estado da WSJ atual, somente OITO em VINTE mangás da MAIOR REVISTA SHONEN seriam shonen. Isso é mais que o suficiente pra podermos estabelecer que não, shonen não é gênero.
O motivo da recusa
O problema de quem diz que shonen é gênero podem ser dois: ou a pessoa desconhece, algo que não tem problema nenhum, ou a pessoa insiste no erro, ou seja ela é burra.
Mas o motivo da recusa vai mais fundo do que isso. As pessoas que sabem que estão erradas e insistem nisso, normalmente o fazem por um sentimento de elitismo. “Eu não leio shonen, só gosto de seinens psicológicos, como Death Note (Weekly Shonen Jump) e Attack on Titan (Bessatsu Shonen Magazine)”, o que faz com que a pessoa no ímpeto de ser muito adulta, se mostre completamente imatura.
A catalogação
Eu preciso deixar muito claro que eu não tenho nada contra criar novos gêneros. O ser humano é obcecado com a criação de padrões, se não o fosse, provavelmente nem existiria ciência. O problema fica em olhar para uma nuvem com formato de nabo e insistir que aquilo é um nabo, não uma nuvem. Algo que, se você tiver mais de seis anos, é motivo de preocupação.
Por isso, estabelecer um gênero (ou, no caso, um subgênero) onde se encaixam mangás “estilo Dragon Ball” pode ser necessário, mas chamá-los de shonen, é um tanto problemático. Felizmente a comunidade já tem um nome pra isso, as pessoas tratam mangás e animes desse estilo como o mangá de batalha, ou battle shonen, um termo muito mais funcional e que consegue englobar séries como One Punch Man, Tokyo Ghoul e Hoshi no Samidare, todos seinens, e não faz com que mangás como Mirai Nikki, Ichigo 100% e Slam Dunk fiquem de fora da sessão shonen.
O cara que só acredita vendo, e depois acaba escrevendo para os outros acreditarem.
10 pensamentos em “Shonen: demografia ou gênero?”
Não sei se posso concordar, pois segundo a definição do Google de gênero (conjunto de seres ou objetos que possuem a mesma origem ou que se acham ligados pela similitude de uma ou mais particularidades.) shonen poderia sim ser classificado como gênero, tendo em vista que todos os animes ditos “shonen” possuem esta determinada similaridade, a qual, no meu ponto de vista seria uma reinterpretação/readaptação oriental do famoso mono-mito denotado por Joseph Capmbell. Sublimo também as definições demonstradas no artigo, pois ante a minha humilde percepção são claramente levianas, tendenciosas e levam o leitor, indubitavelmente, ao erro. Perdoe-me o tom pedante, porém aqui não busco conflitos, mas somente um esclarecimento acerca do gênero shonen, onde eu claramente consigo encontrar diversos arquétipos similares em todos eles como “Cotidiano”, “Chamado”, “Recusa do chamado”, “Grande mestre”… Concluindo todo shonen nada mais é que um anime possuidor da jornada do herói (claro uns seguem os arquétipos de forma mais contundente e outros de forma mais superficial) e este termo me parece válido para uma classificação específica como gênero. Lógico, compreendo teu ponto de vista, e compartilho de tua raiva em relação ao “elitismo”, porém creio eu, particularmente, que as obras mais simples são as mais completas.
Então… Star Wars é shonen pra você?
Eu discordo do site, porque o texto se baseia nas classificações antigas das revistas, sendo tratada a palavra shounen como categoria. No entanto, atualmente se encontra, definições de shounen, shounen, kodomo e seinen, em artigos científicos, que contém estilo narrativo. Ou seja, estilo narrativo não é apenas a idade. Logo, passa a ser categoria.
Você no texto diz que shounen é apenas a revista na qual é publicado. Acontece que animes são publicados em revistas, e podem até mesmo serem modificados. Dororo é um exemplo de um anime que tem se tornado mais sério do que no mangá, pelo que ouvi dizer (já que não li o mangá). O anime atual tem uma diferença de quase 50 anos a mais entre a época em que o mangá foi criado.
Logo, não se pode dizer que shounen é demografia, e não categoria, tendo como argumento apenas que “no passado ele era usado em revista, apenas para dizer a idade do público alvo”.
O passado mudou, e hoje em dia o shounen é usado como categoria, pois, descreve estilo narrativo das histórias. Shounens têm características próprias, como poder da amizade; superação das dificuldades; temas voltado para adolescentes; a maioria tem lutas; etc.
Tais características vão além de demografia, que indica apenas idade, ou no máximo idade e gênero masculino e feminino.
Categoria sim, podemos categorizar por gênero ou por demografia, ou de n outras formas. No mais, todas as bibliografias que li seguem a linha de demografia =/= gênero, embora não tenha lido nenhuma publicação lá muito recente (tipo 5 anos eu chuto), se puder indicar alguns desses artigos, eu me interesso bastante por essas coisas e ficaria feliz em ler.
Anime eu nunca vi ser categorizado como shounen, shoujo, etc, a não ser no popular, coloquial, porque, justamente como tu falou, eles não saem em revistas, portanto não tem como fazer isso, no máximo através de analogias aos mangás que adaptam, que é de onde muitas pessoas tiram essa atribuição, até onde sei, errônea.
Teu exemplo de Dororo está errado, o mangá é basicamente tão pesado e dramático quanto o anime, um pouco menos em certos momentos, um pouco mais em outros. Tanto que no próprio epílogo do mangá, Osamu Tezuka coloca que um dos pontos que o levou a encerrar a obra de maneira um tanto abrupta é que a história acabou se tornando muito mais pesada do que ele havia planejado. Pode ouvir uma palhinha sobre o mangá aqui: https://quadroxquadro.com.br/index.php/2019/01/08/dororo-4-x-quadros-13/
Outra coisa, “poder da amizade; superação das dificuldades”, ou mais precisamente, “amizade, esforço e vitória” são conhecidos como os pilares que regem a Shounen Jump há décadas, embora um ou outro título fuja um pouco. Se olharmos para a demografia como um todo, veremos muito mais variedade e não encontraremos um só, mas diversos estilos narrativos de histórias. E encontraremos estilos narrativos iguais aos de mangás da Shounen Jump frequentemente também em revistas seinen. O exemplo relativamente famoso e recente que deixa isso bem claro, embora com outras demografias que não o shounen envolvidas, é o do mangá Orange, que foi serializado inicialmente em uma revista shoujo, mas depois mudou para uma revista seinen, sem nenhuma mudança em seu estilo narrativo. É apenas uma decisão comercial que algum executivo, ou comitê de executivos, tomou, provavelmente na linha: “Vamos alocar em nossa revista seinen Monthly Action, porque é onde acreditamos que atingirá o maior número de pessoas interessadas nessa história”.
Gostei muito e fique mais informado
Muito bom texto amigo! Só que tem alguns detalhes que precisam ser mais trabalhados, como na parte eu que você chama deliberadamente a pessoa de burra ou na parte em que você descreve a linha de pensamento do que leva alguém a dizer que algo é um shounen poderia ser melhor trabalhado para não parecer tanto debochado por assim dizer. Mas o texto é bem esclarecedor mesmo assim. Muito bom!
Muito bacana o texto! Esclarece bem a questão de categorização, porém fiquei um pouco confuso com o fim do texto. Enquanto no início do texto tu disserta sobre a tua discordância com que “Shonen” fosse considerado um gênero, por ser na verdade uma categoria publicitária bem antiquada (o que eu concordo e acho muito boa a tua argumentação sobre), no final você concorda com que “battle shonen” seja considerado um gênero e ainda diz que é benéfico porque evita que “Mirai Nikki, Ichigo 100% e Slam Dunk fiquem de fora da sessão shonen.”. Battle Shonen não seria um “Frankenstein” de um aspecto (a luta) com público alvo? Não vejo, de forma teórica, como tal nomenclatura possa ser mais funcional, já que ainda delimita público alvo, reafirmando o papo de “coisas para meninos” e “coisas para meninas”, porém adicionando o elemento da “luta”.
Sim, o ideal seria termos um termo totalmente independente da demografia, mas é mais uma questão de pequenas vitórias. O termo frankenstein funcionaria bem pra quem não quer abandonar os maus hábitos, e pode render um próximo passo mais ideal. É como o gênero “filme de super herói” que hoje em dia engloba Logan e Thor Ragnarok, por exemplo, não sendo um termo ideal, mas meio que é o que tem pra hoje. Talvez um termo que resolveria isso seria a versão em português, que é apenas “mangá de batalha” em contraposição ao battleshonen que é um termo mais globalizado.
Sim, no meio acadêmico, usam o termo superaventura para definir esse subgênero de ficção especulativa.
Concordo. 🙂