Yawara!

Yawara! é um mangá do autor Naoki Urasawa, muito famoso no ocidente por seus mangás de suspense (Monster, Pluto, 20th Century Boys, licenciados pela editora Panini no Brasil entre outros) cheios de conspirações. Mas no Japão, o sucesso veio bem antes, com uma obra de comédia, romance e esporte, numa revista voltada ao público seinen, com uma protagonista feminina que foi um ícone nacional por muitos anos. E é sobre esta maravilha pouco conhecida neste lado do mundo que falarei neste post.

Título: Yawara! (Yawara! A Fashionable Judo Girl)
Autor: Naoki Urasawa
Gênero: Esporte, Comédia, Romance
Duração: 29 volumes(mangá)/124 episódios(anime)
Publicação: Big Comic Spirits/Shogakukan
Animação: Madhouse
Direção: Hiroko Tokita
Data: 1986 – 1993 (mangá) / 1989-1992 (anime)

Yawara! conta a história de uma colegial japonesa, neta de um multi-campeão nacional de judô, Inokuma Jigoro e filha de um campeão nacional da modalidade, Inokuma Kojiro. Yawara nunca compete em torneios ou mesmo participa do clube desse esporte no colégio, porém, segue uma intensa carga de treino imposta pelo avô desde muito pequena. Aqui temos uma primeira quebra com os clichês de mangá/anime de esportes: Yawara não quer praticar judô, ou participar de competição alguma. Ela só quer ser uma “garota normal”, ter um namorado bonito, aprender a cozinhar pratos gostosos e fazer uma faculdade que não tenha nada a ver com competições esportivas. O avô, no entanto, não se importa muito com os desejos dela, não faz nenhuma questão que ela ingresse em competição alguma, mas porque quer que ela seja a primeira medalhista de ouro em Olimpíadas, em Barcelona 92 (primeira edição dos jogos com Judô Feminino entre as modalidades disputadas). Além da protagonista Yawara, muitas vezes vemos a história pelo ponto de vista do repórter esportivo Matsuda Kosaku, que recém ingressou na profissão, vindo do interior do Japão para escrever para um jornal de médio porte em Tóquio. Numa determinada ocasião, Matsuda presencia Yawara deter um assaltante que fugia a pé com uma técnica de judô executada de forma tão perfeita que deixou o jornalista encantado, convicto de que a colegial seria a próxima grande estrela do esporte no país. À partir daí, Matsuda passa a acompanhar a vida de Yawara, aguardando pela sua estreia em campeonatos e a evolução de uma carreira profissional. Yawara, por sua vez, reluta muito praticar judô, mas a vida de alguma forma acaba sempre conspirando para que ela mantenha os treinos e acabe participando de competições.

A partir dessa premissa, teremos a introdução de mais algumas personagens importantes: A rival de Yawara (assim proclamada por Jigoro), Hon’ami Sayaka, a garota gênio dos esportes que já havia conquistado o tênis, a patinação e outras modalidades mas sempre se cansava rapidamente dada sua superioridade, mas que encontrou em Yawara uma adversária digna de ser batida. Uma ótima fonte de humor (ainda que muitas piadas sejam bem repetitivas, sempre me divertiam), e uma personagem bastante curiosa: Ela é a mimada, convencida e irritante herdeira de uma cadeia de empresas bilionárias, rainha absoluta em todos os esportes que praticou, mas no judô, apesar de estar sempre dando declarações de superioridade, precisa se esforçar ao máximo, dedicar o esforço da vida em treinamentos com o objetivo de competir em igualdade com a rival, gênio do esporte. Quando veste o judô-gi e sobe no tatami, é digna de ser uma protagonista de mangá shonen de esporte. Vai crescendo ao longo do mangá e cheguei a torcer muito pela Sayaka em alguns torneios.
O galã, mulherengo e jovem mestre de judô Kazamatsuri Shinnosuke, que é a paixão de Yawara e Sayaka (e várias outras figurantes ao longo da série), que em alguns momentos acaba sendo o responsável por manter Yawara no judô, tem uma personalidade bastante irritante e um comportamento muito desagradável em várias situações, mas que por vezes também funciona como alívio cômico. No geral mais odiável do que gostável.
O extremamente emotivo e cheio de energia veterano de escola de Yawara, Hanazono, que é engraçadíssimo e um dos motivadores de Yawara para seguir no judô em dado momento. Vai mudando ao longo da série e acaba por constituir junto com SPOILER a melhor família da cultura pop japonesa =D
Ito Fujiko, que aparece pela primeira vez já numa fase mais avançada do mangá, conhece Yawara na faculdade e elas acabam se tornando melhores amigas. Fujiko é uma engraçadíssima ex-bailarina, que se dedicava ao máximo e vivia para o balé, mas acabou abandonando por ter crescido demais, o que causou dificuldades que não conseguiu superar. Inicialmente mais fechada e com ar triste, acaba encontrando no judô uma nova motivação e em certo momento foi… responsável por manter Yawara no judô… ô.o

Essa série trata muito sobre as escolhas de Yawara ao longo da vida. Começamos a companhá-la no segundo ano do colegial e ao fim do anime ela já se formou na faculdade e está trabalhando há algum tempo. Ao longo deste tempo todo ela tem seus motivos para não querer praticar judô, pensa em desistir, chega a tomar algumas atitudes neste sentido, mas acaba seguindo em frente com o esporte por motivos diversos a cada momento (sempre convencida ou influenciada por alguma outra personagem, como citado no parágrafo anterior). Alguns bem legais, que proporcionam cenas agradáveis. Outros chegam a ser perturbadores, e fazem ter a convicção de que determinada personagem possui um egoísmo, falta de consideração e respeito tamanhas que chegam a indignar o expectador. Mas nem tudo é bondade pura ou maldade extrema, vemos atitudes egoístas por parte de personagens diferentes ao longo da trajetória, e boa parte delas são compreensíveis. Nem toda situação dará sempre sempre certo através do poder da amizade, nem toda atitude egoísta é necessariamente má, nem sempre as pessoas serão sinceras com as outras, às vezes sequer consigo mesmas. E é interessante encarar toda essa imperfeição das personagens, embora algumas situações sejam muito incômodas. Neste quesito, questões de hierarquia e machismo estão presentes e se o mundo é mais difícil para mulheres do que para homens hoje, no Japão do fim dos anos 1980 parecia ser ainda mais complicado. Não são coisas que devam ser meramente relevadas devido à época, porém, não acho que sejam pontos proibitivos para o acompanhamento da obra.

Eu pouco falei de judo em si. Yawara! ainda tem isso, é um anime de esporte. E um dos poucos grandes animes/mangás de esporte com uma protagonista feminina (de cabeça, só lembro de Ace Wo Nerae e Chihayafuru, se considerarmos no segundo Karuta como esporte). Embora ele possa passar vários episódios sem foco no judô, quase sempre tem pelo menos um pouquinho de treino (ou a irritação de Jigoro por não estar havendo tanto treino quanto ele julga adequado). Começamos com treinos no dojo dos Inokuma, vamos ter um pouco de judô no colégio, depois a série vai tendo um ganho de escala bem grande, novas rivais querendo derrotar Yawara aparecem e acabamos acompanhando torneios de todos os tipos, até um específico de judô masculino, competições sem separação por categoria de peso, com participantes internacionais (da TCHECOSLOVÁQUIA, UNIÃO SOVIÉTICA e países assim por exemplo XD) e até torneios femininos sem a protagonista. E quem diria, Naoki Urasawa é muito bom em fazer mangá de esporte também. Tiveram várias lutas bem legais, por diferentes motivos. Algumas bem engraçadas, outras com a tensão de que qualquer resultado seria possível, e outras bem empolgantes. Aliás, bem interessante que algumas lutas são muito boas por causa da expectativa, e a quebra ou manutenção dessa expectativa é geralmente imprevisível. Não como se eu nunca acertasse a ganhadora de uma luta, porém, em muitos, talvez maioria dos casos realmente só se consegue constatar o resultado no final.

Fast Light Speed Ippon Zeooooooi!!!
Inokuma Yawara no Ippon Zeoi!!!
Inokuma Yawara
Lovely and Cute: Miss Inokuma Yawara is a fashionable judo girl

Para fechar, Naoki Urasawa é, há muitos anos, um dos meus autores de mangá preferidos. Suas histórias me instigam bastante, gosto de suas personagens, aprecio o ritmo muitas vezes mais arrastado do que o que estou acostumado em outros mangás e sua quadrinização é excelente. Ainda assim eu curiosamente nunca me dispus a ler todas as suas obras. Li 20th Century Boys e na sequência assisti ao anime e li o mangá Monster, mas em relação a Pluto já demorei um bom tempo para ir atrás, e acompanhei Billy Bat por alguns anos conforme os capítulos eram lançados e traduzidos por fãs (preciso retomar a leitura, recomeçar, mais provavelmente), mas sem ter um motivo aparente, nunca me dispus a ler toda a sua bibliografia. Além disso, sempre que cogitava ler todas as publicações de Urasawa, me ocorriam sempre Monster, 20th Century Boys, Pluto, Master Keaton e posteriormente Billy Bat, quando estreou. Abstraí involuntariamente a existência de Happy! e Yawara!. Em 2016, porém, acabei por me deparar com um post do blog XIL falando sobre “Yawara!, um Urasawa Diferente do que Você Conhece”, que me deixou muito curioso, especialmente por relatar a enorme dimensão que a obra possui no Japão, sendo que no ocidente ela é praticamente desconhecida, a despeito da fama do autor. Resolvi ler Yawara! e valeu muito à pena (embora tenha concluído apenas o anime, já que o mangá possui apenas uma fonte de tradução por fãs, que foi descontinuada). Fica minha forte recomendação para quem busca um mangá de esporte. Ou uma obra do Naoki Urasawa. Ou um slice of life mais longo. Ou um bom seinen. Ou pra qualquer outra pessoa que consiga acompanhar legendas em inglês. Ou fale japonês. Ou… tá, acabei. Ou não? =)

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